13 de fevereiro de 2025

A Palavra de Deus na prática, o segredo da alegria em meio à tribulação

Alegria, Paciência e Oração, um guia para enfrentar a vida

"Alegrai-vos na esperança, sede pacientes na tribulação, perseverai na oração" (Rm 12,12)

Quantas vezes escutamos ou lemos isso, não é mesmo? Mas você entende o que está escrito? Você sabe quando deve usar? Vou lhe explicar melhor do meu jeito.

A Palavra de Deus na prática

Crédito: pcess609 / GettyImages

Alegrai-vos na esperança

Mesmo que, hoje, você não tenha nenhum motivo para estar alegre, que tudo aquilo que o deixa feliz lhe tenha sido tirado, ainda que você tenha perdido tudo e, hoje, seja só desespero e desolação, por causa da esperança, firmada nela, você tem um motivo para sorrir e alegrar-se.

A esperança é a certeza dos bens futuros, é a certeza de que Deus tem sempre algo melhor para nós, que o sofrimento do tempo presente está me habilitando para o bem futuro. Mas isso não é um jeito iludido de ver a vida, Carla? Se você acredita em Nosso Senhor Jesus Cristo, não é! Ele é a rocha onde construímos a casa da nossa esperança. E "a esperança não decepciona" (Rm 5,5).

Sede pacientes na tribulação

Imagine você, no meio do Furacão Milton que passou pela Florida… Você amarrou a casa, fechou os janelas com aquelas proteções fortes, enfim, fez tudo o que estava ao seu alcance naquela situação. Então, resta-lhe, agora, pegar a sua cadeira mais confortável, sentar-se em algum lugar seguro e esperar passar o furacão. Veja, não estou falando sobre furacões reais, estou falando sobre situações que acontecem na sua vida e parecem furacões.


Nessa analogia, podemos compreender duas coisas. A primeira é: você pode agir antes e depois do furacão; durante, você só pode esperar e continuar rezando. Há furacões que nos dão tempo de nos prepararmos para evitar prejuízos maiores, e há furacões que chegam de surpresa. Se formos homens espirituais, nunca seremos pegos de surpresa, pois um bom soldado está sempre em alerta. A segunda coisa é: quando ele está acontecendo, não é hora de amarrar a casa, tampar as janelas etc. É hora de ser paciente.

E qual é o trabalho do paciente? Esperar até melhorar, esperar até o médico dar alta. Exercer a paciência.

Perseverai na oração

Por fim, antes, durante e depois rezar! Rezar sem cessar! Rezar quando tudo vai bem, rezar quando tudo vai mal, rezar para que as coisas voltem a ficar bem, e rezar, rezar, rezar…

"Aqueles que rezam fazem mais pelo mundo do que aqueles que combatem" (Dom J. B. Chautard).

Santo Afonso nos diz: "Quem reza, certamente, salva-se; quem não reza, certamente, será condenado".

Rezar não é coisa apenas de mulher, rezar é coisa para quem está vivo! Eu diria: você respira? Então é bom que reze! Quando? Sempre!

"Orai sem cessar" (1Tes 5,17) é uma ordem de Deus para nós!

Eu espero que o ajude a compreender que a Palavra de Deus nos foi dada como um presente para que a usemos, e não basta termos decorado alguns versículos, precisamos colocá-la em prática. Intimidade com a Palavra de Deus é intimidade com o próprio Deus.

Carla Picolotto 
Missionária Núcleo da Comunidade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/comportamento/palavra-de-deus-na-pratica-o-segredo-da-alegria-em-meio-tribulacao/

12 de fevereiro de 2025

Águas mais profundas, o chamado de todo cristão

Duc in Altum, um chamado à renovação cristã no novo milênio

No início do novo Milênio, quando humanamente pareciam extremamente limitadas suas condições de saúde, o Papa São João Paulo II surpreendeu positivamente a Igreja e o Mundo, com a Exortação Apostólica "Novo Millenio Ineunte", incentivando novos passos para a vida cristã. Assim dizia São João Paulo II na abertura do documento: "Ressoam, hoje, na Igreja, as palavras com que um dia Jesus convidou o Apóstolo a fazer-se ao largo para a pesca: Duc in altum – "Avança para águas mais profundas, e ali lançai vossas redes para a pesca" (Lc 5,4).

Águas mais profundas, o chamado de todo cristão

Crédito: Anthony Middonte / GettyImages

Pedro e os primeiros companheiros confiaram na palavra de Cristo e lançaram as redes. 'Assim fizeram e apanharam uma grande quantidade de peixes' (Lc 5,6). Duc in altum! Águas mais profundas! Essas palavras ressoam hoje aos nossos ouvidos, convidando-nos a lembrar com gratidão o passado, a viver com paixão o presente, abrir-se com confiança ao futuro. Pois Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e sempre (Hb 13, 8)"

Jubileu 2025: esperança e evangelização em águas mais profundas

Neste Jubileu de 2025, como Peregrinos de Esperança, não nos é possível ficar estagnados diante de todas as realidades provocantes de qualquer tempo, inclusive os nossos dias! Desejamos ouvir de novo a palavra de Jesus, com a ajuda da Liturgia do Quarto Domingo Comum, convidando-nos a buscar águas mais profundas, identificando tarefas e horizontes novos a serem alcançados com afinco, pois Jesus Cristo é o mesmo, ontem, hoje e sempre!

O largo horizonte que se abre, como meta desafiadora oferecida à Igreja, e aqui pensamos na Igreja de Belém, é a Evangelização. Existimos como Igreja para evangelizar, levar a Boa Nova de Jesus Cristo a todos os recantos e a todas as pessoas, sejam quais forem as condições em que se encontrem. Todos têm direito a receber o anúncio de Jesus Cristo Salvador e Redentor. Temos o dever de envolver a todas as Comunidades de Igreja neste impulso evangelizador, sem deixar ninguém de fora.

E da parte de quem já está consciente de sua vida cristã, que esta seja fortalecida em todos os sentidos, para que já seja evangelizadora, em todas as suas expressões, começando pelo testemunho pessoal. Para tanto, podemos primeiro olhar para quem está mais distante, como aqueles que olham para o mar aberto e veem o Céu se encontrar com a Terra. É que desejamos favorecer este encontro entre nosso Deus, a Igreja e todas as pessoas amadas por Deus!

Evangelização sem fronteiras, das periferias aos afastados

Nosso olhar e nossas iniciativas pensem primeiro e saibam agir pelas periferias geográficas, sociais e existenciais. Os mais pobres e abandonados se sintam incluídos em nossa ação evangelizadora! E tem sido esta nossa linha de ação, especialmente com a criação de Áreas Missionárias e a implantação de novas Paróquias! Entretanto, desejamos olhar para um público, digamos, diferenciado! Trata-se das pessoas distantes ou indiferentes, algumas afastadas por culpa própria ou de alguém, mas que se distanciaram da Igreja e do anúncio do Evangelho.


É bom incluir em nossa ação pastoral e evangelizadora uma porcentagem muito significativa da população que não frequenta nossas Paróquias ou Comunidades, mas são pessoas igualmente amadas por Deus! A elas queremos chegar, de forma especial, pela oração, pelo testemunho de serviço, pelo diálogo respeitoso diante de seus questionamentos, tudo isso fecundado pela capacidade de escuta, com a qual nos fazemos um com todos, sem exceção!

Juventude em missão, o futuro da Igreja se constrói agora

E contamos de forma especial, para chegar a todos, com as promessas de futuro para nossa Igreja. Trata-se de investir decididamente na juventude, e temos uma força juvenil crescente, com disposição para um impulso missionário. E aqui, a partir da Coordenação Arquidiocesana da Pastoral Juvenil, desejamos fortalecer estruturas físicas e pastorais suficientes. Nossa Arquidiocese é pioneira na implantação do Centro Juvenil Arquidiocesano, um projeto que pede a participação e envolvimento de todas as forças pastorais de nossa Igreja. Daí, nasça um apelo a que todas as Paróquias e Comunidades tenham organizada a sua Pastoral Juvenil, nas várias formas hoje existentes.

Todas as Paróquias, sem exceção, empenhem-se nesta direção! Se olhamos para o futuro, nasceu em nossa Igreja uma proposta que desejamos ver assumida em todas as instâncias. Se são frágeis as estruturas familiares em nosso tempo, desejamos, propomos e de verdade insistimos para que se organize nas Paróquias uma "Pastoral Vocacional para o Matrimônio". Seus agentes podem ser a Pastoral Familiar, o Encontro de Casais com Cristo e outros Movimentos ou Serviços que trabalham pelas Famílias, os Encontros preparatórios ao Casamento, além do empenho em vista de celebrações adequadas do Sacramento do Matrimônio e também dos chamados Casamentos Comunitários, a serem sempre celebrados de acordo com as normas da Igreja.

Da família à paróquia, fortalecendo a catequese e a iniciação cristã

A partir da família, desejamos ainda abrir o horizonte da Catequese de acordo com o modelo da Iniciação à Vida Cristã, em positiva e progressiva implantação em nossa Igreja, com as etapas que configuram os passos dados no Catecumenato. Cada Paróquia e cada Comunidade se empenhe, de forma decidida e prioritária, na ação catequética!

E alargando o olhar para o mar aberto de nosso tempo, um desafio é a participação na construção da sociedade. Levantamos três pontos apenas, dentre tantos a serem identificados posteriormente. O primeiro deles é a participação dos cristãos leigos na política, pois ainda não encontramos o método adequado, pedindo agora que o Espírito Santo nos inspire.

Depois, a violência crescente e a insegurança urbana, que exige diálogo, compromisso das autoridades e da população, assim como o empenho no testemunho da caridade. Enfim, em novembro, Belém será sede da COP 30, um evento mundial com desejadas consequências positivas quanto ao clima e ao meio ambiente, para o qual a Igreja Católica se prepara e deseja dar a sua contribuição, diante da sociedade pluralista em que nos encontramos.

Dom Alberto Taveira Corrêa
Arcebispo Metropolitano de Belém do Pará


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/catequese/aguas-mais-profundas-o-chamado-de-todo-cristao/

11 de fevereiro de 2025

Nossa Senhora de Lourdes, intercessora dos doentes



A Santíssima Virgem Maria, a Mãe de JESUS, é, por excelência, santa entre os santos. Nas suas dezenas de aparições reconhecidas pela Santa Igreja Católica está a de Lourdes. A partir dessa aparição, Nossa Senhora, neste título de Lourdes, é invocada por fiéis de várias partes do mundo, que lhe apresentam situações de saúde, tornando-se assim, a padroeira dos doentes.

Aparição
Foi no ano de 1858 que a Virgem Santíssima apareceu 18 vezes nas cercanias de Lourdes, França, na gruta Massabielle, a uma jovem chamada Santa Marie-Bernard Soubirous ou Santa Bernadete. Essa santa deixou por escrito um testemunho que entrou para o ofício das leituras de 11 de fevereiro.

Escritos
"Certo dia, fui com duas meninas às margens do Rio Gave buscar lenha. Ouvi um barulho, voltei-me para o prado, mas não vi movimento nas árvores. Levantei a cabeça e olhei para a gruta. Vi, então, uma senhora vestida de branco; tinha um vestido alvo com uma faixa azul celeste na cintura e uma rosa de ouro em cada pé, da cor do rosário que trazia com ela. Somente na terceira vez, a Senhora me falou e perguntou-me se eu queria voltar ali durante quinze dias. Durante quinze dias lá, voltei; e a Senhora apareceu-me todos os dias, com exceção de uma segunda e uma sexta-feira. Repetiu-me, vária vezes, que dissesse aos sacerdotes para construir, ali, uma capela. Ela mandava que fosse à fonte para lavar-me e que rezasse pela conversão dos pecadores. Muitas e muitas vezes perguntei-lhe quem era, mas ela apenas sorria com bondade. Finalmente, com braços e olhos erguidos para o céu, disse-me que era a Imaculada Conceição".

Nossa Senhora de Lourdes e a conversão para os pecadores

Conversão para os pecadores
Maria, a intercessora, modelo da Igreja, imaculada, concebida sem pecado, nessa aparição, pediu o essencial para a nossa felicidade: a conversão para os pecadores. Ela pediu a conversão dos pecadores pela oração, conversão e penitência.

Contexto
Isso aconteceu após 4 anos da proclamação do Dogma da Imaculada Conceição. Deus quis e Sua Providência Santíssima também demonstrou, dessa forma, a infalibilidade da Igreja, que chancela do céu essa aparição da Virgem Maria em Lourdes, os milagres que aconteceram e continuam a acontecer naquele local, lá onde as multidões afluem, o clero e vários Papas estiveram.

Oração – proteção e refúgio
"Sob a Tua proteção procuramos refúgio, Virgem Imaculada de Lourdes, que és o modelo perfeito da criação segundo o plano original de Deus. A Ti, neste dia, confiamos os doentes, os idosos, as pessoas sozinhas: alivia o seu sofrimento, enxuga as suas lágrimas e obtém para cada um a força necessária para realizar a vontade de Deus. Sê o amparo de todos que aliviam, dia após dia, os sofrimentos destes irmãos. E ajuda-nos a crescer no conhecimento de Cristo, que, com a Sua morte e ressurreição, venceu o poder do mal e da morte."

Nossa Senhora de Lourdes, intercedei por nós!


Outros santos e santas celebrados em 11 de fevereiro:

  • Santa Soter, virgem e mártir em Roma [† c. 304]
  • São Castrense, mártir na Itália [† data inc.]
  • São Secundino, bispo na Itália [† s. V/VI]
  • São Severino, abade na França [† s. VI]
  • São Gregório II, papa [† 731]
  • São Pascoal I, papa [† 824]
  • Santo Ardão, abade na França [† 1066]
  • São Pedro Maldonado, presbítero e mártir, morto com golpe na cabeça enquanto celebrava Missa [† 1937]

Fontes:

Pesquisa e Redação:
Fernando Fantini – Comunidade Canção Nova


Fonte: https://santo.cancaonova.com/santo/nossa-senhora-de-lourdes-intercessora-dos-doentes/

10 de fevereiro de 2025

O Evangelho não se adequa ao mundo, mas sim nós ao Evangelho

Deus como fundamento da moralidade, uma resposta ao relativismo

Vivemos em um mundo onde os defensores da moral católica, muitas vezes, precisam agir com cautela ao se opor aos erros da sociedade contemporânea. A distinção entre certo e errado tornou-se obscura para muitos, consequência do relativismo moral que se espalhou nas sociedades. Nesse contexto, não há mais uma verdade objetiva, mas apenas "verdades pessoais", frequentemente moldadas pelo egoísmo e interesses individuais.

O Evangelho não se adequa ao mundo, mas sim nós ao Evangelho

Crédito: oatawa / GettyImages

No entanto, a verdade moral é objetiva, pois está ancorada na natureza divina, que é imutável. Deus, o Bem supremo, é a fonte última do que é bom e do que é mau. Como ensinou São João Paulo II: "Só Deus, o Bem supremo, constitui a base irremovível e a condição insubstituível da moralidade, e portanto dos mandamentos, em particular dos negativos que proíbem, sempre e em todos os casos, o comportamento e os atos incompatíveis com a dignidade pessoal de cada homem."

Moral católica × relativismo moral
             
"Quem acredita no que quer do Evangelho e rejeita o que não quer, não crê no Evangelho, mas em si
mesmo" (Santo Agostinho).

A lei natural é a participação da criatura racional na lei eterna de Deus, orientando o homem para o bem conforme a sua natureza. A lei divina revelada inclui a lei natural, mas também ensina verdades sobrenaturais que a razão sozinha não poderia alcançar. Ao obedecer aos mandamentos, o homem mantém não apenas a ordem social, mas também a ordem de seu próprio ser, vivendo conforme o desígnio divino.

Diferentemente das demais criaturas, o homem enfrenta dilemas morais próprios de sua racionalidade. Assim, é um erro interpretar sua natureza humana apenas como uma natureza biológica ou instintiva, pois a palavra "natureza" assume sentidos distintos: enquanto os animais seguem seus instintos, o homem discerne moralmente e escolhe entre o bem e o mal.

Além da lei natural, Deus estabeleceu os sacramentos como canais de graça para que o homem possa viver os mandamentos com o auxílio divino. Para evitar uma experiência mecânica dos sacramentos, foi criada a moral sacramental, que ensina como os sacramentos exigem disposição moral adequada e uma vida coerente com a fé.

O relativismo moral contradiz a moral católica, pois nega a existência de uma verdade objetiva sobre o bem e o mal, abrindo margem para interpretações subjetivas e individuais da doutrina da Igreja. Essa mentalidade, frequentemente, substitui a verdade divina pelos desejos pessoais, levando ao afastamento dos princípios morais objetivos. Como consequência, não apenas a vida individual é afetada, mas também a ordem social, tornando mais difícil o consenso sobre o que é certo ou errado. Esse cenário favorece a propagação de ideologias contrárias à fé cristã, muitas das quais têm raízes em visões pagãs ou secularizadas do mundo.

A atemporalidade do Evangelho

O dogma cristão pode progredir, mas apenas na sua explicação, nunca na sua essência, a essência cristã é imutável. São Vicente de Lérins afirmava que o autêntico desenvolvimento da doutrina deve ser como o crescimento de um corpo: ele pode se desenvolver, mas sem perder a sua identidade.

"Mas talvez diga alguém: então não haverá na Igreja de Cristo nenhum progresso da religião? Certamente que haverá, e grandíssimo! Pois quem poderá ser tão inimigo dos homens e tão contrário a Deus que tente impedir isto? Mas deve ser um progresso verdadeiro, e não uma mudança de fé. Pois o progresso significa que cada coisa cresce em si mesma; a mudança, porém, significa que algo se transforma em outra coisa" (São Vicente de Lérins).

Papa Pio XII também afirmava: "Se, pois, em matérias de fé e costumes, ocorre divergência entre o que alguém diz ser verdadeiro e a verdade revelada por Deus, tal divergência não pode ser de forma alguma admitida" (Pio XII)

Santo Agostinho reforça a atemporalidade da fé cristã, mostrando que ela não é uma invenção cultural mutável, mas a verdade eterna revelada por Deus: "A religião cristã já existia entre os antigos, e nunca deixou de existir, desde o início do gênero humano até a vinda de Cristo na carne".

Devemos nos elevar a Cristo

O Evangelho não se rebaixa à mediocridade do homem; é o homem que deve se elevar ao Evangelho, deixando para trás as misérias e os pecados, buscando uma vida em Deus.


Reconhecer o pecado é um passo fundamental nessa caminhada. O inimigo usa diversas ferramentas para confundir e desviar do caminho. Por isso, apegar-se à moral cristã não é uma opção, mas um dever para todo católico. É preciso cautela para não permitir que ideologias pagãs ofusquem a verdade e deturpem o que é certo.

É necessário pedir a graça de ter a capacidade de, cada vez mais, buscar a Verdade:

Ó Maria,

 Mãe de misericórdia,

 velai sobre todos

 para que a Cruz de Cristo não seja desvirtuada,

 para que o homem não se afaste do caminho do bem,

 nem perca a consciência do pecado,

 mas cresça na esperança

 em Deus, «rico de misericórdia» (Ef 2, 4),

 cumpra livremente as boas obras

 por Ele de antemão preparadas (cf. Ef 2, 10),

 e que toda a sua vida seja

 «para louvor da Sua glória» (Ef 1, 12)

Matheus Eleutério
Estudante de Jornalismo da Faculdade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/comportamento/o-evangelho-nao-se-adequa-ao-mundo-mas-sim-nos-ao-evangelho/

Cultivando o futuro, a arte de aprender a esperança

Cultivar a esperança, o propósito central do ano jubilar

Aprender a cultivar esperança é nobre propósito do Ano Jubilar 2025, promovido pela Igreja Católica no mundo inteiro. Meta existencial muito importante quando se considera que é essencial reconhecer o sentido da vida, para vivê-la como dádiva de Deus. Uma dádiva a ser desdobrada em dom para o semelhante, alicerce de uma cidadania qualificada com força para oferecer contribuições civilizatórias e, assim, ajudar a mudar o mundo, superando a violência e a exclusão social.

Cultivando o futuro, a arte de aprender a esperança

Crédito: lovelyday12

Investir no aprendizado da esperança é meta que não pode ser simplesmente emoldurada pela procura por êxitos, pois corre-se o risco de se encontrar frustrações. É preciso cultivar a necessária resiliência espiritual, para vencer qualquer sentimento de desencanto e se fortalecer na batalha pelo bem. Aprender a cultivar a esperança é, pois, dinâmica de humanização, indispensável para não se correr o risco de reduzir as próprias motivações aos números que traduzem lucros.

A grande esperança, Deus como sustento e plenitude

A arte de esperar tem um alcance muito além da busca por posses ou bens que, sozinhos, não garantem sentido ou razão ao viver. Vive-se por meio de pequenas e grandes esperanças, que alimentam cada peregrino em sua caminhada.

Importa alimentar-se da grande esperança, que supera as demais e as alimenta, aquela que não deixa o ser humano cair. Trata-se de força que conduz a uma nobreza que dignifica o viver. A grande esperança é Deus, o único que pode dar ao ser humano a vida plena, aquela que não passa.

Esperança em cristo, um caminho para a plenitude humana

Sem a esperança maior, todas as outras se reduzem à fugacidade do tempo, que passa velozmente, revelando que cargos, títulos ou conquistas têm importância relativa. Requer-se a competência humana e espiritual para compreender que a vida é dom de Deus, precedendo tudo que se pode conquistar em termos de bens, patrimônios ou oportunidades. E o Deus que dá a vida como dom não é um Deus qualquer, tem rosto humano.

A esperança maior, que vem do amor de Deus, tem em Cristo Jesus a sua fonte mais visível. Onde Jesus é amado alimenta-se a esperança. Trata-se do lugar onde se aprende a cultivar a esperança que não decepciona, qualificando o viver humano para libertá-lo da mesquinhez e dos estreitamentos que aprisionam a generosidade solidária.

Oração, fonte de esperança que transforma, segundo Bento XVI

No caminho para aprender a cultivar esperança, vale acolher as preciosas indicações do Papa Bento XVI, na sua Carta Encíclica sobre a esperança que salva. Bento XVI aponta a oração como privilegiado exercício para fortalecer a esperança, experiência incontestável para reconhecer que Deus escuta os clamores dos orantes – aqueles que jamais estão sozinhos. A Carta Encíclica lembra o testemunho do cardeal vietnamita Van Thuan, nos seus 13 anos de prisão, dos quais nove vividos em uma minúscula solitária.

O Cardeal alimentou uma fonte crescente de esperança pela oração. Quando libertado, se tornou testemunha da esperança. A oração alarga o coração para viver de modo coerente com a grandiosidade relativa à criação do ser humano. O diálogo com Deus, pela oração, acende a luz da esperança, sem ilusões ou fantasias, elevando a alma
orante a uma condição que, humanamente, é impossível alcançar. Assim, a oração faz brotar a esperança que não ilude, purificando o ser humano de fantasias e egoísmos mesquinhos, a partir do diálogo com Deus.

Fortalecendo a esperança com a oração, uma jornada pessoal e comunitária

A esperança fidedigna que nasce da oração, pessoal e comunitária, alimenta corações e confere habilidades essenciais aos peregrinos de esperança. As preces ajudam, inclusive, a fortalecer a esperança nas situações marcadas por sofrimento, ajudando a enfrentar a desilusão do cansaço ou os arroubos dos fanatismos.


A esperança conquistada a partir do diálogo com Deus oferece equilíbrio à travessia de diferentes momentos históricos, possibilita reconfigurar a política, qualificando o exercício da cidadania, a partir do poder indestrutível do amor. Mesmo quando as circunstâncias são desfavoráveis, ainda que sejam enfrentados fracassos ou contradições comuns à vida, a esperança maior não deixa o ser humano desistir, possibilitando-o encontrar sentido no sofrimento e, assim, vencê-lo, tornando-o força redentora.

A força da esperança, superando o sofrimento e construindo o futuro

O sofrimento natural da finitude humana converte-se em força de redenção quando vivido no horizonte da esperança maior, alicerçando o compromisso de se buscar superar os sofrimentos dos inocentes e vulneráveis. A esperança fortalece aqueles que tem fé tornando-os instrumento na construção de novos caminhos, que levam ao bem, a
partir da sabedoria que vem de uma fonte inigualável: Deus.

Assim, o peregrino de esperança conquista uma força que é poeticamente apresentada por Thiago de Mello, na sua poesia Memória da Esperança: "Na fogueira do que faço por amor me queimo inteiro. Mas simultâneo renasço para ser barro do sonho e artesão do que serei. Do tempo que me devora me nasce a fome de ser. Minha força vem da frágil flor ferida que se entreabre resgatada pelo orvalho da vida que já vivi". Força interior daqueles que buscam aprender a esperança.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo Metropolitano de Belo Horizonte


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/jubileu-2025/cultivando-o-futuro-arte-de-aprender-esperanca/

7 de fevereiro de 2025

A função pedagógica do sofrimento humano

Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal (RN)

 


O sofrimento humano é uma realidade inescapável da existência. Todos, em algum momento da vida, enfrentam dores físicas, emocionais ou espirituais. Mas qual é a razão do sofrimento? Seria ele um absurdo sem sentido ou pode ser compreendido como parte de um processo de crescimento e aprendizado? A partir de uma reflexão teológica, especialmente baseada na Carta aos Hebreus (12,4-7.11-15), e do pensamento de filósofos como Søren Kierkegaard, Emmanuel Lévinas e Viktor Frankl, podemos considerar o sofrimento sob uma perspectiva pedagógica e redentora. 

A Carta aos Hebreus nos ensina que o sofrimento não deve ser visto como uma punição sem propósito, mas como um meio pelo qual Deus educa seus filhos. O autor sagrado nos exorta a perseverar na luta contra as estruturas de pecado que se opõem ao Reino de Deus: "Vós ainda não resististes até ao sangue na vossa luta contra o pecado" (Hb 12,4). Essa luta traz consigo dores e tribulações, mas também purifica e fortalece o espírito. Como um pai corrige o filho a quem ama, Deus permite que seus filhos passem por provações para que possam crescer na santidade e na justiça: "Pois qual é o filho a quem o pai não corrige?" (Hb 12,7). Embora nenhuma correção seja prazerosa quando ocorre, ela gera frutos de paz e justiça naqueles que foram exercitados por ela (cf. Hb 12,11). 

A vida cristã comporta desafios e exige coragem, resiliência e uma profunda comunhão com Cristo. Ele, sendo inocente, sofreu até o extremo da cruz e, por sua obediência ao Pai, conferiu ao sofrimento um sentido redentor. A dor não é um fim em si mesma, mas um caminho para a purificação e a santificação: "Firmem as mãos cansadas e fortaleçam os joelhos enfraquecidos" (Hb 12,12). 

Søren Kierkegaard, em O Desespero Humano (1849), considera o sofrimento essencial à existência humana. Ele pode levar à angústia e ao desespero, mas também à fé verdadeira. Para ele, a dor confronta o ser humano com a finitude e fragilidade da vida e o conduz a um "salto de fé" em Deus, abrindo caminho para uma relação autêntica com o Transcendente, encontrando um sentido mais profundo para sua existência. 

Para Emmanuel Lévinas, em Ética e Infinito (1982), o sofrimento não pode ser reduzido a uma explicação racional. Ele nos interpela e exige uma resposta ética e compassiva. A dor do outro nos desafia a sair do egocentrismo e assumir a responsabilidade ética por ele. Assim, o sofrimento transcende a experiência individual e se torna um chamado moral à solidariedade e ao amor ao próximo. 

Viktor Frankl, psiquiatra e sobrevivente do Holocausto, em Em Busca de Sentido (1946), argumenta que o sofrimento pode ter significado quando vivido com propósito. Mesmo nas condições mais extremas, como nos campos de concentração nazistas,  Frankl observou que aqueles que encontravam um sentido em seu sofrimento eram mais resilientes. Para ele, não é o que nos acontece que nos define, mas a maneira como reagimos diante do sofrimento. 

Frankl propõe que buscar um sentido para a vida pode transformar a dor em um caminho de crescimento. Essa visão se alinha à perspectiva cristã, que vê o sofrimento como um meio de santificação e participação no mistério redentor de Cristo. 

O sofrimento humano pode parecer absurdo sob uma perspectiva materialista. No entanto, a teologia e a filosofia mostram que ele pode ter uma dimensão pedagógica, redentora e ética. A Carta aos Hebreus nos ensina que Deus permite o sofrimento como forma de educação espiritual. Kierkegaard demonstra que a dor pode levar à fé autêntica, enquanto Lévinas nos chama à responsabilidade pelo sofrimento alheio. Por fim, Frankl nos lembra que o sofrimento pode ser suportado quando encontramos um sentido nele. 

Longe de ser um absurdo, o sofrimento pode nos conduzir ao crescimento, à transcendência e à solidariedade. Como afirma a Escritura: "Meus irmãos, tende por motivo de grande alegria o passardes por várias provações, sabendo que a prova da vossa fé produz perseverança" (Tg 1,2-3). 


Fonte: https://www.cnbb.org.br/a-funcao-pedagogica-do-sofrimento-humano/

6 de fevereiro de 2025

Deus nos chama e nos dá uma Missão

Dom Antonio Carlos Rossi Keller
Bispo de Frederico Westphalen (RS)



Neste 5º Domingo do Tempo Comum, a liturgia nos convida a refletir sobre a vocação e a missão que Deus nos confere. A centralidade da mensagem deste Domingo é o convite a estarmos à disposição para ouvir e responder ao chamado de Deus, mesmo diante das nossas limitações e medos. Através das Leituras bíblicas, somos desafiados a reconhecer que, assim como os personagens bíblicos, também cada um de nós é chamado a servir e a testemunhar a fé, independentemente das nossas fraquezas e inseguranças.

Na 1a Leitura (Isaías 6,1-8), ouvimos como Isaías tem uma visão do Senhor em Sua glória. Tal visão leva a reconhecer sua própria situação de pecador. A simbólica purificação de Isaías com a brasa viva mostra a purificação necessária para a missão confiada por Deus. Isaías ouve a voz do Senhor perguntando: "Quem enviarei?" e prontamente responde: "Eis-me aqui, envia-me" (Isaías 6:8). Essa resposta destaca a prontidão e a disposição para servir, mesmo quando se sente indigno. A experiência de Isaías nos ensina que a verdadeira vocação começa com o reconhecimento de nossa fragilidade e a aceitação da graça divina que nos capacita a cumprir a missão que nos é confiada.

Na 2a Leitura (1 Coríntios 15,3-8.11), São Paulo recorda a ressurreição de Cristo e a importância do testemunho dos apóstolos. Ele enfatiza que a fé cristã se fundamenta na ressurreição, a qual é o cerne da mensagem que os apóstolos proclamam. São Paulo menciona que Cristo "morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, e que foi sepultado, e que ressuscitou ao terceiro dia" (1 Coríntios 15:3-4). A inclusão de testemunhas da ressurreição reforça a credibilidade da mensagem e a continuidade da missão dos discípulos. Essa passagem nos lembra que a nossa fé não é apenas a crença em algumas ideias, mas fundamenta-se em um testemunho vivo da ação de Deus na história da salvação e na vida dos que acreditam.

No Evangelho (Lucas 5,1-11), Jesus chama os primeiros discípulos após um milagre de pesca. A obediência de São Pedro, mesmo em sua dúvida, resulta em uma abundância de peixes. Jesus diz a Pedro: "Não temas: de agora em diante serás pescador de homens" (Lucas 5:10). Este relato ilustra como a fé e a disposição para seguir a palavra de Jesus podem levar a resultados extraordinários. O chamado de Jesus para ser "pescador de homens" é um convite à missão que todos os cristãos são chamados a viver, por coerência à vocação batismal. Assim como Pedro, somos convidados a deixar nossas inseguranças e a confiar na providência divina, sabendo que Ele nos capacita para a missão que nos confia.

As Leituras deste Domingo nos convidam a refletir sobre como respondemos ao chamado de Deus em nossas vidas. Assim escutando o profeta Isaías, devemos estar abertos e querer sempre a purificação de nossos pecados e dispostos a servir. Com São Paulo, aprendemos a importância de reconhecer a centralidade da ressurreição do Senhor em nossa fé e, como São Pedro, devemos estar prontos para agir, mesmo quando a dúvida nos assalta. A disposição para ouvir e responder ao chamado de Deus é fundamental para nossa vida cristã. É essencial que cada um busque discernir sua própria vocação, confiando que Deus nos capacita e nos guia em nossa jornada de fé.

Em conclusão, que este domingo nos inspire a viver nossa vocação com coragem e fé, sabendo que somos chamados a ser instrumentos da graça de Deus no mundo. Nossa Senhora nos acompanhe e nos ajude a responder sempre "Eis-me aqui" ao chamado do Senhor.


Fonte: https://www.cnbb.org.br/deus-nos-chama-e-nos-da-uma-missao/

4 de fevereiro de 2025

São Bernardino de Sena e a publicidade em prol do Evangelho

A estratégia de marketing: criando soluções para as necessidades

Quem nunca se irritou com um anúncio publicitário? Muito provavelmente você também já se estressou com o panfleteiro que o parou na rua para lhe entregar um flyer, com os comerciais que interromperam o vídeo que você está vendendo e os spams que lotam em sua caixa de e-mail.

São Bernardino de Sena e a publicidade no prol do Evangelho

Crédito: Iryna Melnyk/GettyImages

O excesso de informações e de anúncios que nos cercam nos dias atuais se torna um desafio para os profissionais de Marketing, que precisam, a todo custo, chamar a atenção de seus consumidores. Por conta disso, a comunicação é cada vez mais personalizada, e uma estratégia utilizada é específica para as necessidades de cada indivíduo. Sendo assim, é preciso entrar na realidade do consumidor, a fim de entendê-lo e convencê-lo de que o produto comercializado pode ajudá-lo a resolver seus problemas.

Marketing 2.0 no século XIV? Uma lição inesperada de São Bernardino

Apesar deste olhar voltado para o cliente ser recente – um conceito que ficou conhecido como Marketing 2.0 –, o padroeiro dos publicitários já aplicou essa "técnica" na virada do século XIV para o século XV. São Bernardino de Sena, nascido na Itália em 1380, foi um dos maiores pregadores do seu tempo e soube como "convencer seu público" a aceitar o Evangelho.

Após se tornar órfão com apenas sete anos, Bernardino foi criado por duas tias que alimentaram a fé em seu coração. Na juventude, estudou na Universidade de Sena, mas abandonou tudo para ingressar na Ordem Franciscana. Na vida religiosa, ele desenvolveu seu intelecto, estudando os grandes doutores e teólogos da Igreja. Contudo, foi o mundo dos camponeses que deu o contributo definitivo para a sua formação.

A "conversão" de São Bernardino, um modelo de comunicação eficaz

Em meio ao povo, o frei Bernardino aprendeu expressões e anedotas, e quando se tornou um pregador, passou a explicar o Evangelho de uma forma mais compreensível. Para além da simplicidade, suas pregações foram transmitidas por uma vivacidade que era capaz de fazer vibrar o coração desde as pessoas mais humildes até os mais instruídos. A vivência da fé, transmitida com verdade, faz com que o Evangelho não somente alcance aqueles que ouviram o frade falar, mas também os convencesse da necessidade de ter também a presença de Jesus em seus corações.


Se a publicidade toca as necessidades do público-alvo para vender uma solução em forma de produto ou serviço, São Bernardino de Sena foi capaz de revelar ao povo como apenas Deus poderia ajudá-los em todos os seus sofrimentos e angústias. Durante sua vida, o religioso prometeu anunciar o Evangelho por toda a Itália, levando milhares de pessoas a se converter.

Que, a exemplo de São Bernardino de Sena, sejamos capazes de olhar para aqueles que estão ao nosso redor e, compreendendo suas dores, proclamar verdadeiramente – e não como meros anúncios que todos tentam ignorar – a salvação que vem de Deus.

São Bernardino de Sena, rogai por nós!

Gabriel Fontana
Jornalista da Comunidade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/sao-bernardino-de-sena-e-a-publicidade-em-prol-do-evangelho/

3 de fevereiro de 2025

Ancorados na esperança, o fundamento para todo cristão

A jornada do peregrino guiado pela esperança cristã

A esperança é a âncora do peregrino. Sem esperança, faltará a luz indispensável para o caminho de cada pessoa. A luz da esperança dissipa sombras, afronta e vence o medo, firma os passos na direção certa, com realismo, escancarando as portas da vida à ação do alto. A esperança imprime a orientação, indicando a direção e a finalidade da existência humana, uma compreensão que emoldura o horizonte deste Ano Jubilar 2025, celebrado pela Igreja Católica, a todos oferecendo a oportunidade de ser peregrinos de esperança. Tornar-se peregrino de esperança é qualificação que se desdobra em profundo sentido humanístico e espiritual, possibilitando corrigir rumos na contemporaneidade, com entendimentos novos, capazes de inspirar o necessário equilíbrio humano-ecológico.

Ancorados na esperança

Créditos: Liudmila Chernetska

Assim, a indicação sábia do apóstolo Paulo, escrevendo aos Romanos no século primeiro da Era Cristã, precisa ser sempre lembrada: "Alegres na esperança, pacientes na tribulação, perseverantes na oração". Transbordar em esperança para alargar corações, convencidos de que o amor é o único caminho de reconciliação, de construção da fraternidade universal. A alegre esperança, quando vivida, fecunda, no coração, o entusiasmo de um amor oferente, sustentando um profundo sentido social e político da cidadania. Ajuda a romper as amarras dos interesses mesquinhos, das manipulações e da ganância. Capacita o ser humano para exercer a generosidade gratuita – a oferta de um sorriso, um gesto de amizade, um olhar fraterno, uma escuta sincera, um serviço gratuito.

A generosidade é o pilar da civilização, a esperança em ação

Generosidade especialmente exercida quando se oferece as próprias aptidões e responsabilidades profissionais ao propósito de construir um horizonte civilizatório marcado pela amizade social. A esperança capaz de inspirar transformação não é uma esperança qualquer, nem mesmo consiste em aposta cega, fundamentada em sentimentos que, não raramente, estão distantes da realidade. Ela tem propriedades para ancorar os peregrinos, razões que produzem luz e vigor.

A esperança que não confunde tem fundamento divino, portas abertas para a vida eterna, iluminando de modo adequado a vida que passa como um piscar de olhos. Trata-se de esperança com luz inigualável, que leva a uma verdade essencial: a história da humanidade, de cada pessoa, não corre para uma meta sem saída e nem para um abismo escuro. É orientada para a glória do Senhor, como assinala o Papa Francisco no documento de convocação deste ano jubilar. Faz-se importante, pois, adentrar, sempre mais, nas ricas dimensões constitutivas da esperança que não confunde e não decepciona.

Redenção pelo amor, a chave para esperança de todo cristão

A esperança cristã tem uma fisionomia ampla e rica. Vivê-la proporciona um horizonte novo e luminoso. Mas o que se pode esperar? O Papa Bento XVI, na sua Carta Encíclica Spes Salvi – Salvos pela esperança – apresenta essa interrogação com uma resposta repleta de lições. Bento XVI lembra que progresso por adição só é possível no campo material, com processos de dominação da natureza. Nos campos da consciência ética e da decisão moral é diferente, pois a liberdade humana sempre se renova – não deve estar sujeita à dominação. Por isso mesmo, o bem-estar moral não é garantido somente pelas estruturas, por mais essenciais que sejam.

Precisa das decisões e das escolhas do conjunto de cidadãos, norteadas por um horizonte inspirador que se alimenta de uma esperança que não decepciona. A ciência contribui incontestavelmente para a humanização do mundo, mas não consegue redimir a interioridade do ser humano. Uma esperança fundada apenas na ciência é, pois, insuficiente. Não se redime a pessoa pela ciência, mas pelo amor, afirma o Papa Bento XVI. Experimentar na vida um grande amor é experienciar a redenção.

Jesus Cristo, o fundamento da esperança

Saiba-se que o fundamento da esperança que não decepciona é uma pessoa, tem um nome, Jesus Cristo, o Salvador. Ele é o único fundamento da esperança que não decepciona. A esperança fidedigna se alicerça na oferta do sacrifício e na ressurreição de Cristo. Ela é capaz de orientar a humanidade, pois Cristo possibilita uma compreensão que ilumina todo olhar com a luz da fraternidade, inspirando estilos de vida que ajudam a superar cenários de miséria e de exclusão, garantindo o respeito à dignidade de todos.


Não existe outro caminho para transformar a sociedade, partilhando as conquistas da ciência, qualificando a política, promovendo a vida. É preciso buscar a esperança que se fundamenta em Jesus. O ano jubilar permita a todos alcançar a sabedoria alicerçada em Cristo, qualificando cada ser humano para ser autêntico peregrino de esperança.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/catequese/ancorados-na-esperanca-o-fundamento-para-todo-cristao/

31 de janeiro de 2025

Educar corações!

Cardeal Jaime Spengler
Presidente da CNBB

Há questões que caracterizam a existência humana, as quais cada geração é chamada a responder: Quem sou eu? Que sentido tem a vida? Qual a sua origem e seu objetivo? Qual a razão do existir? Qual sentido dar a tudo que experimentamos? O que buscamos? Qual o horizonte norteador das próprias escolhas, decisões e ações? Que lugar tem o outro na vida?

Numa sociedade líquida, caracterizada pela rapidez, o instantâneo e fugaz semelhantes questões são relegadas a segundo plano, em detrimento da própria saúde da sociedade. A violência e a brutalidade, em suas múltiplas expressões, requerem das melhores forças da sociedade uma introspecção honesta e profunda sobre o tipo de mundo em que vivemos, queremos viver e almejamos deixar para as próximas gerações.

Promover e aprofundar conhecimentos humanísticos, culturais e científicos se torna em tal contexto uma exigência. Urge identificar um núcleo de convergência, um horizonte de compreensão que ofereça sentido ao lugar onde o ser humano se encontra, ao seu empenho de viver a vida com suas possibilidades, desafios e ameaças.

A tradição ocidental caracterizou como núcleo de convergência do humano o 'coração'. É ele que, na fragilidade dos eventos transcorridos, percebe o esplendor de algo característico, permitindo-nos, por exemplo, não esquecer a graça de um olhar, a despretensiosa disponibilidade de uma mão estendida, a importância da presença amiga.

Lugar de destaque neste trabalho possuem as escolas e universidades, sem olvidar o que compete a instituição familiar. Os processos pedagógico-educacionais não podem estar focados somente na preparação de indivíduos para o mercado de trabalho. Decisivo é orientar e formar, com determinação e disciplina, para uma convivência social integrada e integradora, onde a dimensão do coração tem certamente lugar de destaque.

Isto implica "uma educação integral que não se limita à transmissão de conhecimentos, mas busca formar homens e mulheres capazes de compaixão e amor fraterno (…) Uma educação que prepara para o futuro, formando, além de profissionais competentes, adultos maduros que serão artesãos de um mundo mais belo e mais humano" (Papa Francisco).

Segundo artigo da série do cardeal Jaime Spengler em reflexão sobre a quarta encíclica do Papa Francisco "Dilexit nos", sobre o amor humano e divino do Coração de Jesus Cristo.


Fonte: https://www.cnbb.org.br/educar-coracoes/

30 de janeiro de 2025

Jesus Cristo é a luz do mundo nos padres da Igreja

Dom Vital Corbellini
Bispo de Marabá (PA)



O evangelista São João coloca Jesus, luz do mundo, no debate com os judeus (cf. Jo 8,12). Ele veio até a realidade humana para nos revelar o amor infinito de Deus para com a humanidade, para nos libertar das trevas do pecado e levar-nos à comunhão com Deus. Nós somos chamados a viver a luz de Cristo em meio às ações boas, caritativas e problemáticas humanas, às mudanças climáticas, e a testemunhar as graças, os louvores a Deus Uno e Trino e à sua Igreja. O bom testemunho leva as pessoas ao contato com o Senhor, para a verdadeira luz, Jesus Cristo. Vejamos a seguir esta concepção nos santos padres, os primeiros escritores cristãos.
O significado da Luz, Jesus Cristo
Santo Ambrósio, bispo de Milão, no século IV disse ao público fiel, cristão de seu tempo, concepções essenciais sobre Jesus Cristo, como luz do mundo. O autor tinha presente a Palavra de Deus, que Jesus é o esplendor da glória do Pai (cf. Hb 1,3). Ele sendo Deus extrai a luz da luz (Jo 1,9). Ele veio do Pai, de modo que tudo o que o Filho tem é do Pai e tudo o que é do Pai é também do Filho. Jesus é a fonte da luminosidade, do brilho, dia que nunca termina.
O sol que ilumina
Santo Ambrósio também afirmou que Jesus é o verdadeiro sol, uma palavra profética presente em Malaquias (cf. Ml 3,20) que brilha com esplendor eterno. O Senhor é desde sempre junto com o Pai e com o Espírito Santo. Um pedido é feito do fundo do coração é para que Ele venha, infunda nos nossos corações e naqueles das pessoas da humanidade, a luz radiosa do Espírito Santo.
O dia seja na normalidade
Santo Ambrósio, pela oração dirigida ao Senhor pediu para que transcorra alegre o dia, na sua normalidade, que a modéstia seja como a luz do amanhecer. A pessoa faz o bem durante o dia de modo que o Senhor olhe para ela com fé com amor. A fé seja uma força para carregar com alegria os desafios diversos, o ânimo não conheça as trevas do pecado.
A aurora no seu caminho
Santo Ambrósio pediu ainda ao Senhor no seu hino de louvor ao Cristo como luz do mundo que a aurora prossiga no seu caminho, mostrando a luz que seguirá a aurora. O Filho está todo no Pai e todo o Pai está no Filho . É a unidade perfeita na qual o Filho conhece o Pai, o revela para o mundo e às criaturas, sobretudo ao ser humano. Ele é de fato a luz do mundo que brilha nas trevas, levando as pessoas e os povos à luz divina, à luz do Deus Uno e Trino.

A ação das pessoas cristãs
A Carta a Diogneto, escrito do século II colocou a ação das pessoas cristãs no mundo, por causa de seu seguimento a Jesus Cristo, como luz do mundo: "Os cristãos, de fato, não se distinguem dos outros homens, nem por sua terra, nem por sua língua ou costumes" . A Carta reforçou o dado que os cristãos não possuíam cidades próprias, nem tinham uma língua estranha, nem tinham algum modo especial de viver e de vida. A sua doutrina não dizia respeito à invenção própria, nem professavam algum ensinamento humano.
Os costumes do lugar e do estrangeiro
Os cristãos estando em cidades gregas e bárbaras, adaptavam-se aos costumes do lugar em relação à roupa, ao alimento, e testemunhavam um modo de vida social muito admirável . Na continuidade da vivência dos cristãos na forma de sua descrição, eram percebidos como pessoas que participavam de tudo mas sabendo que um dia passarão desta terra. "Vivem na sua pátria, mas como forasteiros: participam de tudo como cristãos e suportam tudo como estrangeiros. Toda pátria estrangeira é pátria deles, e cada pátria é estrangeira" .
A vida familiar
O seguimento a Jesus, como luz do mundo apontou também à vida familiar, de todo o fiel que segue o Senhor. As pessoas casavam-se como todas e geravam filhos, filhas, de modo que não abandonavam os recém-nascidos . As autoridades romanas não aceitavam o abandono dos filhos nas praças. Muitos cristãos adotavam esses filhos e filhas para a convivência familiar, como forma de caridade. A carta também dizia que os cristãos estavam na carne, mas não viviam segundo a carne. Eles estavam na terra, mas carregavam a esperança de uma cidadania no céu.
As leis estabelecidas e as perseguições
A Carta a Diogneto tinha presentes que os cristãos obedeciam às leis estabelecidas, mas com os seus testemunhos ultrapassavam as leis. Eles amavam a todas as pessoas, e eram perseguidos, desconhecidos, mas sofriam condenações, eram mortos e tinham consciência de que eles receberão a vida. Eles eram pobres, mas enriqueciam a muitas pessoas, eram desprezados, mas eles tornavam-se glorificados, amaldiçoados, mas serão proclamados justos.
A importância da caridade
O Senhor colocou-nos como mandamento maior, o amor. "Amarás ao Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com todo o teu entendimento". Esse é o maior e o primeiro mandamento!. Ora, o segundo lhe é semelhante: "Amarás teu próximo como a ti mesmo". Toda a Lei e os Profetas dependem desses dois mandamentos (Mt 22,37-40). São Leão Magno, bispo de Roma no século V teve presentes este mandamento aludindo à piedade e à caridade cristãs, em vista de ser verdade o amor a Deus e ao próximo como a si mesmo, e também à toda a humanidade, na qual nós temos em comum a natureza seja as pessoas amigas, seja as inimigas. O Bispo de Roma afirmou que o mesmo Criador que nos plasmou é o mesmo Redentor que nos deu a vida .
Jesus Cristo é a luz do mundo. Com Ele nós sigamos o caminho da verdade, da vida e do amor a Deus, ao próximo como a si mesmo. A missão nos leva a viver a luz do Senhor no mundo de hoje, marcado por violências, mortes, guerras, mas nós carregamos a esperança de um mundo melhor, mais fraterno, mais humano na unidade com o Senhor Jesus e à Igreja.

29 de janeiro de 2025

A contribuição de São Tomás de Aquino para o diálogo entre razão e fé

Relação equilibrada e harmônica entre razão e fé: um legado filosófico-teológico de Tomás de Aquino para a cultura ocidental

O pensamento de Tomás de Aquino é, em geral, caracterizado como genuinamente cristão, por trazer a mais íntima relação entre razão e fé, entre filosofia e teologia. O seu pensamento estaria inserido no contexto da formulação paradigmática, bem conhecida da filosofia como serva da teologia – philosophiae ancilla theologiae -, como era recorrente na medievalidade.

A busca pela harmonia entre razão e fé

Visões racionalistas e fideístas reconfiguradas, na contemporaneidade, trazem sinais equivocados, ainda persistentes, sobre a compreensão do real modelo tomista de distinção entre filosofia e teologia. No entanto, Tomás de Aquino buscou demarcar, com clareza meridiana, as rigorosas relações entre razão e fé. Uma demarcação fundamental para se entender bem os limites cognitivos da razão em relação à fé, evitando-se os exageros tanto do racionalismo, quanto do fideísmo, não raras vezes, nos tempos hodiernos, identificados em comunicações em diversos ambientes de divulgação de ideias filosóficas e teológicas.

O sistema tomista: a razão e os limites do conhecimento

O sistema tomista baseia-se na determinação rigorosa das relações entre razão e fé. É certo que a razão pode muito em termos de conhecimento, mas não pode tudo conhecer. Ela tem seus limites. Foi necessário que a razão se completasse com a fé, com aquilo que lhe é revelado. Entretanto, a revelação não anula nem torna inútil a razão, vale dizer, a graça não elimina a natureza, antes a aperfeiçoa – gratia non tollit naturam sed perficit.

A contribuição da razão para a fé

A razão não pode demonstrar o que pertence ao domínio da fé, porque a fé teria o seu conteúdo esvaziado. A razão não ultrapassa seus próprios limites, pois ela não atua de forma invasiva. Nesse sentido, Tomás de Aquino reconhece que a razão muito contribui para preparação da fé. Essa contribuição da razão para a fé se dá de três modos distintos.

A razão ajuda a demonstrar as verdades da fé

Em primeiro lugar, a razão ajuda a demonstrar aquelas coisas que podem ser consideradas como preâmbulos da fé, ou seja, aquelas verdades cuja demonstração é necessária à própria fé. Não se pode crer naquilo que foi revelado, se não se sabe que Deus existe. A razão demonstra que Deus existe e que possui características e atributos que podem ser inferidas das coisas por Ele criadas.

A razão ilustra as coisas que pertencem à fé por comparações

Em segundo lugar, a razão ilustra, por meio de certas semelhanças, as coisas que pertencem à fé, isto é, a razão pode ser utilizada para aclarar as verdades da fé mediante comparações.

A razão opõe-se as coisas que se o contrapõe a fé

Em terceiro lugar, a razão opõe-se às coisas que são ditas contra a fé, vale dizer, a razão pode rebater as objeções contra a fé, demonstrando que são falsas ou, ao menos, que elas não têm força demonstrativa (Aquino, 1990, p. 28).

Tomás de Aquino e a crítica aos averroístas

Na realidade, Tomás de Aquino tinha se posicionado contra os averroístas, a partir de interpretações enviesadas de Aristóteles. Os averroístas tinham esvaziado a fé de todo conteúdo racional e expunham a razão a uma angustiante crise de fé. E os averroístas latinos procuraram contornar a questão, recorrendo à teoria da dupla verdade, ou seja, é verdadeiro, mas de modo bem diverso, tanto o que ensina a razão quanto o que ensina a fé (Mondin, 1981, p. 171-172). Tomás de Aquino propunha correções aos averroístas. Os argumentos tomistas estavam assentados em três pontos fundamentais. Em primeiro lugar, razão e fé são sim modos distintos de conhecer, mas isso não conduz a uma dupla verdade. A razão admite a verdade por causa de sua evidência intrínseca, enquanto a fé aceita a verdade por causa da autoridade de Deus revelador (Aquino, 2009, p. 139). Em segundo lugar, razão e fé não podem contradizer-se. Deus é a fonte comum. Desse modo, a verdade da razão não pode jamais entrar em conflito com a verdade revelada, porque a verdade não pode contradizer a verdade. Se aparece uma oposição entre elas, é sinal de que não se trata propriamente da verdade, e sim de inferências errôneas, falsas em suas premissas e, por conseguinte, falsas em suas conclusões (Aquino, 1986, p. 115). E, em terceiro lugar, não obstante a razão seja suficiente para conhecer as verdades fundamentais da ordem natural e tenha sua autonomia no conhecimento das coisas naturais, ela é incapaz, por si só, de penetrar nas verdades mais profundas da ordem sobrenatural, que constituem seu bem último (Aquino, 1990, p. 31).

Os limites da razão e a demonstração da existência de Deus

O princípio aristotélico, segundo o qual todo conhecimento começa pelos sentidos, foi utilizado por Tomás de Aquino para limitar a capacidade e as pretensões da razão. A razão natural pode elevar-se até Deus, porém, seu ponto de partida são as coisas sensíveis, ou seja, é mediante a razão natural que o homem, através das criaturas, pode alcançar o conhecimento de Deus. Assim, afirma-se que "[…] as criaturas conduzem ao conhecimento de Deus, como o efeito conduz à causa." (Aquino, 2009, p. 555).

São Tomás de Aquino; Crédito: Bartolomé Esteban Murillo/Domínio Público

Os domínios da fé e da razão

São dois tipos de demonstrações possíveis à razão. Uma a priori ou propter quid, que parte da causa para o efeito; a outra, a posteriori ou quia, que parte do efeito para a causa. Na concepção tomista, somente a segunda via pode ser utilizada para o conhecimento de Deus. Esclarecidos os domínios da razão e da fé, Tomás de Aquino passou, então, a tratar dos correspondentes atos, entre eles, notadamente, o ato de fé. Era preciso entender o que é a fé. Para isso, ele aderiu a um conceito agostiniano, qual seja, cogitare cum assenso, quer dizer, pensar com anuência (Aquino, 2012, p.73).

O escolástico examinou esse conceito e o aprofundou, pois era necessário entender melhor o "pensar" que nele estava inserido. Ele envolve uma consideração indagadora do intelecto. O pensar, que é próprio da fé, é um ato intelectual que continua a indagar justamente porque ainda não se tem uma perfeição de algo que ainda está em cogitação. Assim, no pensar do crente estão envolvidas três espécies de operações intelectuais: duvidar, suspeitar e opinar. O duvidar consiste em não se inclinar nem para o sim nem para o não. O suspeitar já se caracteriza por se inclinar para um lado, mas sem deixar de ser movido por sinais apresentados pelo outro lado. O opinar se configura pela aderência a um lado, embora não desapareça o receio de que o lado contrário possa ser verdadeiro. Uma vez bem estabelecidas essa noção intelectual, então, deve ficar claro que o ato de crer se aproxima da adesão firme a um dos lados, a uma das partes, e aqui o ato de crer se assemelha ao que tem ciência, porque possui evidências de algo que já consegue conhecer. Entretanto, esse conhecimento do crente não é tão perfeito como daquele que tem uma evidência perfeita diante de si. O conhecimento do crente tende ao duvidar, ao suspeitar até chegar ao opinar, motivo pelo qual é próprio do crente pensar com anuência. Essa anuência implica que haverá inevitavelmente sempre uma escolha voluntária, o que inclina o homem para um lado e não para outro. Em última instância, a fé é uma adesão a um lado de alguma coisa, uma vez formada a opinião sobre ela. Por isso, baseado na Carta aos Hebreus, na concepção tomista, ela é "[…] a prova das coisas que não se veem." (Aquino, 2012, p.53).

A certeza da fé e a vontade

Para Tomás de Aquino, portanto, a certeza da fé está baseada na certeza da vontade, que acaba por aderir a uma opinião formada sobre algo. O ato de fé é mesmo um cogitar com assentimento, um pensar com anuência, sobre algo a que se decidiu aderir por opinião formada, sem que isso chegue a se tornar uma certeza objetiva, que fica reservada somente à ciência, porque a fé não é mobilizada por um objeto, mas sim por uma escolha voluntária.

Tomás Aquino buscou estabelecer rigorosas relações entre razão e fé, demarcando seus campos cognitivos e não contraditórios, de modo a se evitar os equívocos tanto do racionalismo, quanto do fideísmo, ainda persistentes, não raras vezes, nos tempos hodiernos. A razão se completa com a fé, com aquilo que lhe é revelado. A revelação, por sua vez, não anula nem torna inútil a razão, vale dizer, a graça aperfeiçoa a natureza, e não a anula. Para o escolástico, razão e fé têm modos distintos de conhecer, mas isso não conduz a uma dupla verdade; ao contrário, a fonte da verdade para a razão e para a fé é uma só, Deus. Razão e fé não podem contradizer-se, porquanto, Deus é a fonte comum da verdade que elas buscam conhecer.

A razão é suficiente para conhecer as verdades fundamentais da ordem natural e tem sua autonomia no conhecimento das coisas naturais, embora tenha limites próprios que a inviabilizem de penetrar nas verdades mais profundas da ordem sobrenatural, que constituem o bem último. A razão natural pode elevar-se até Deus, porém seu ponto de partida não é o próprio Deus, e sim as coisas sensíveis, isto é, do efeito conduz para a causa. São dois tipos de demonstrações possíveis à razão. Ela não segue a demonstração a priori ou propter quid, que parte da causa para o efeito, e sim a demonstração a posteriori ou quia, que parte do efeito para a causa.

O ato de fé: pensar com anuência

Depois de esclarecidos os domínios da razão e da fé, então, Tomás de Aquino colocou no epicentro do diálogo entre ambas o ato de fé. Este é entendido como pensar com anuência, o que envolve uma consideração indagadora do intelecto. O pensar, que é próprio da fé, é um ato intelectual que continua a indagar justamente porque ainda não há uma perfeição, já definida e definitiva, que caracterize o que se busca conhecer. Nesse pensar do crente há três operações intelectuais, quais sejam, duvidar, suspeitar e opinar.

I. Duvidar: cogitar a possibilidade do sim e do não para algo;
II. Suspeitar: tender para um lado, mas sem ignorar os sinais do outro lado;
III. Opinar: se caracteriza pela adesão a um lado, embora não desapareça o receio de que o lado contrário possa ser verdadeiro.

O ato de crer

O ato de crer requer adesão firme a um dos lados, a uma das partes, e, dessa maneira, ele se assemelha ao que tem ciência, porque possui evidências de algo que já consegue conhecer. Todavia, o conhecimento do crente não é tão perfeito como daquele que tem uma evidência perfeita diante de si. Por isso, o conhecimento do crente tende ao duvidar, ao suspeitar até chegar ao opinar, motivo pelo qual é próprio do crente pensar com anuência. No ato de fé, portanto, há sempre uma escolha voluntária, o que inclina o crente para um lado e não para outro. Por isso, em última instância, a fé é uma adesão a um lado de alguma coisa, uma vez formada a opinião sobre ela.

Assim, para Tomás de Aquino, a certeza da fé está baseada na certeza da vontade, que acaba por aderir a uma opinião formada sobre algo. O ato de fé é mesmo um cogitar com assentimento sobre algo a que se deliberou aderir por opinião formada, sem que isso chegue a se tornar uma certeza objetiva, que é reservada somente à ciência, porque a fé não é mobilizada por um objeto, mas sim por uma escolha voluntária.


O legado de Tomás de Aquino

A busca de uma relação equilibrada e harmônica entre razão e fé constitui, sem sombra de dúvida, um legado filosófico-teológico de Tomás de Aquino para a cultura ocidental. A propósito, são muito significativos os seguintes dizeres sobre a novidade perene do pensamento de São Tomás de Aquino:

[…] Tomás reconhece que a natureza, objeto próprio da filosofia, pode contribuir para a compreensão da revelação divina. A fé, então, não teme a razão, mas a procura e nela confia. Como a graça supõe a natureza e a leva a cumprimento, […], assim a fé supõe e aperfeiçoa a razão (João Paulo II, 1998, p. 92, tradução nossa).

Destarte, o pensamento tomista ainda constitui, nos tempos atuais, um ponto de equilíbrio coerente e consistente entre razão e fé, bem como um verdadeiro tesouro deixado pelo Doutor Angélico para as sociedades contemporâneas que, não raras vezes, se conduzem como massas arrebanhadas e manipuladas pelos movimentos pendulares dos racionalismos estéreis e dos fideísmos obscurantistas.

 

Marcius Tadeu Maciel Nahur
Natural de Lorena (SP), Coordenador do Curso de Filosofia da Faculdade Canção Nova. Formado em Direito, História e Filosofia. Mestrado em Direito com ênfase na Filosofia de Henrique Cláudio de Lima Vaz. Delegado de Polícia Aposentado.


Referências

AQUINO, Tomás de. Suma teológica. Tradução de Aldo Vannucchi et al. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2012. v. V. 682 p.

AQUINO, Tomás de. Suma teológica. Tradução de Aldo Vannucchi et al. São Paulo: Loyola, 2009. v. I. 693 p.

AQUINO, Tomás de. Suma contra os gentios. Tradução de D. Odilão Moura O.S.B. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia; Universidade de Caxias do Sul; e, Livraria Sulina Editora, 1990. v. V. 376 p.

AQUINO, Tomás de. Exposición del De Trinitate de Boecio. Traducción de Alfonso García Marqués. Pamplona: Ediciones Universidad de Navarra, 1986. 302 p.

JOÃO PAULO II. Fides et Ratio: i rapporti tra fe e ragione. Casale Monferrato: PIEMME, 1998. 168 p.

LIBERA, Alain de. A Filosofía Medieval. Tradução de Nicolás Nyimi Campanário e Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva. São Paulo: Loyola, 1998. 532 p.

MONDIN, Battista. Curso de Filosofia. Tradução de Bênoni Lemos. 9. ed. São Paulo: Paulus, 1981. v. 1. 227 p.


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/contribuicao-de-sao-tomas-de-aquino-para-o-dialogo-entre-razao-e-fe/