12 de março de 2025

Francisco, um Papa fora da curva

Papa Francisco,um líder fora da curva na construção de um sonho

Ao receber o convite da Canção Nova para escrever um texto formativo para a sua página oficial, senti-me honrada e, ao mesmo tempo, profundamente consciente da responsabilidade que isso implica. Este texto surge em um momento especial e delicado: o Papa Francisco está hospitalizado, e nossas orações se unem ao desejo de vê-lo recuperado, com saúde e força para continuar sua missão. Sua ausência temporária nos faz refletir sobre o quanto ele é essencial para a Igreja e para o mundo. Francisco não é apenas um líder espiritual; ele é um farol de esperança, um profeta da misericórdia e um construtor de pontes em um mundo marcado por divisões.

Créditos: Acervo Pessoal

Nessas linhas, gostaria de dialogar sobre alguns pontos fundamentais do seu papado, que têm transformado não apenas a Igreja, mas também a minha vida e a vida de tantas pessoas nesta Casa Comum. Sua visão de uma Igreja sinodal e em saída, sua defesa incansável da paz, sua preocupação com o meio ambiente, sua valorização das mulheres, sua forma única de comunicar e, acima de tudo, sua humanidade são pilares que sustentam um projeto de Igreja mais próxima, mais justa, mais amorosa, mais humanizada e humanizadora. Precisamos de Francisco com vida e saúde, porque seu sonho ainda está em construção, e cada um de nós é chamado a ser parte dessa caminhada.

O Papa Francisco é, a meu ver, um líder fora da curva. Ele não se coloca em um pedestal; pelo contrário, ele mesmo se diz pecador, gente como a gente, e essa humildade é o que o torna tão próximo e querido. Francisco rejeita as pompas e os formalismos que, muitas vezes, cercam o cargo que ocupa. Ele prefere a simplicidade: suas vestes são simples, escolheu morar na Casa Santa Marta em vez do Palácio Apostólico para estar mais perto das pessoas e facilitar encontros com representantes da Igreja de todo o mundo.

Ele não faz questão de ir para a casa de veraneio, em Castel Gandolfo, cidade vizinha de Roma, preferindo ficar onde pode servir e estar próximo dos fiéis. Seu senso de humor e sua capacidade de rir de si mesmo são contagiantes, mostrando que a fé não precisa ser austera para ser profunda. Amo as imagens publicadas do Papa Francisco rindo com vontade. E quem não se emocionou ao saber que, no ano passado, ele deu seus próprios sapatos para um pobre poder ir ao jantar de final de ano com o Papa? Gestos como esse revelam um homem que vive o que prega, transformando o Evangelho em ações concretas de amor e solidariedade. Francisco não é apenas um Papa, ele é um exemplo de como viver a fé com autenticidade e compaixão.

Papa Francisco, uma encíclica ambulante de amor

Para mim, o Papa Francisco é uma verdadeira Encíclica ambulante de amor. Ele não apenas fala sobre o Evangelho; ele o vive, encarnando-o no cotidiano e nas coisas mais simples da vida. Suas palavras e gestos são como páginas abertas de um ensinamento que nos convida a amar sem limites, a servir sem esperar recompensas e a acolher sem fazer distinções. Francisco nos mostra que a santidade não está nos grandes feitos, mas na capacidade de transformar o ordinário em extraordinário através do amor. Cada encontro, cada sorriso, cada palavra sua é um convite a vivermos o Evangelho com os pés no chão e o coração aberto ao mundo.

Um líder humano, sinodal e em saída

A experiência de conviver de perto com o Papa Francisco, seja através do trabalho na Rádio Vaticano, participando de suas missas e traduzindo as suas audiências e a Missa do Galo – atividades estas que eu amava fazer na Rádio – ou quer seja em encontros pessoais, possibilitou-me estar muito próximo e conhecer muito de perto um líder cuja humanidade e simplicidade transcendem o cargo que ocupa. Sua Santidade não é apenas o Sumo Pontífice da Igreja Católica, é um homem que vive aquilo que prega, demonstrando um profundo respeito por cada pessoa, sem exceção.

Durante meu tempo na Rádio Vaticano, pude observar como ele trata a todos com igual dignidade, seja um chefe de Estado ou um refugiado, um homem ou uma mulher. Essa atitude não é apenas um gesto de cortesia, mas uma expressão clara de sua visão de uma Igreja acolhedora, onde ninguém é excluído. Francisco nos lembra, a cada gesto, que a fé se vive no encontro com o outro. E vale destacar, aqui, a certeza que ele tem de que o Senhor se deixar encontrar quando acolhemos com amor crianças, mulheres, homens refugiados e migrantes em busca de melhores condições de vida.


Um dos momentos mais marcantes da minha trajetória foi o encontro com o Papa em 2016. Naquele dia, ele segurou minha mão e, com um olhar profundamente sincero, perguntou se eu sabia que era "duas vezes importante", desenho o número dois com os dedos como se pode ver na imagem. Ele mesmo respondeu: "Uma porque você é scalabriniana, e outra porque é brasileira". Na simplicidade daquelas palavras, havia uma profunda mensagem: Francisco valoriza as identidades culturais e religiosas, reconhecendo que a riqueza da Igreja está na diversidade de seus membros. Esse gesto não apenas tocou meu coração, mas também me fez refletir sobre como cada um de nós é único e insubstituível aos olhos de Deus.

Um Papa aberto, atento e próximo

Outro aspecto que marcou minha relação com o Papa Francisco foi a troca de cartas. Em um mundo cada vez mais digital, ele mantém a tradição de responder pessoalmente, com cartas físicas que chegam às nossas casas. Essas respostas não são meras formalidades; são gestos de cuidado e atenção que revelam sua profunda humanidade. Cada linha escrita por ele reflete uma escuta atenta e um desejo genuíno de dialogar. Essa prática nos lembra que a comunicação, para Francisco, não é apenas sobre transmitir mensagens, mas sobre construir pontes e fortalecer laços.

Sua visão de comunicação também se reflete em sua linguagem simples e direta, que consegue alcançar pessoas de todas as idades e culturas. Ele fala ao coração, usando palavras que inspiram e consolam. Essa habilidade não é acidental; é fruto de sua convicção de que a comunicação deve ser um instrumento de encontro e diálogo, nunca de divisão.

Francisco tem sido um defensor da maior participação das mulheres na Igreja. Ele não apenas fala sobre a importância das mulheres, mas age, colocando-as em cargos de destaque no Vaticano. Essa postura é um sinal claro de seu desejo por uma Igreja mais inclusiva, onde todos, independentemente do gênero, possam contribuir com seus dons e talentos.

Preocupação com o meio ambiente e uma Igreja em saída

A preocupação do Papa Francisco com o meio ambiente é outro aspecto que merece destaque. Em sua encíclica Laudato Si', ele nos convida a cuidar da "Casa Comum", lembrando que a crise ambiental é também uma questão moral. Para ele, a degradação do planeta está intrinsecamente ligada à injustiça social, e a Igreja tem um papel crucial na promoção de um desenvolvimento sustentável e justo. Essa visão integrada reflete sua capacidade de enxergar as conexões entre fé, ética e vida cotidiana.

O sonho de uma Igreja sinodal e em saída é talvez o traço mais marcante do pontificado de Francisco. Ele nos convida a construir uma Igreja onde todos caminham juntos, ouvindo e discernindo coletivamente. Ao mesmo tempo, ele insiste que a Igreja não pode se fechar em si mesma; deve sair ao encontro das pessoas, especialmente dos mais pobres e marginalizados. Essa visão não é apenas um projeto, mas um chamado à conversão contínua, tanto pessoal quanto comunitária.

Compaixão pelos migrantes e refugiados

O Papa Francisco, conhecido por sua profunda paixão e dedicação aos migrantes e refugiados, tem sido uma fonte de inspiração constante em meu trabalho de comunicação na Congregação. Sempre obediente à vontade do Sumo Pontífice, tive a honra de realizar, aqui no Brasil, as Campanhas para o Dia Mundial do Refugiado. Em 2021, promovemos a Campanha Em Fuga, um esforço significativo em prol daqueles que marcados pelas guerras, pela fome e pela injustiça buscam acolhida em outros países.

Ao enviar o material da campanha ao Santo Padre, fui surpreendida com uma carta física, enviada pelo correio, na qual Francisco expressou seu agradecimento e estendeu suas bênçãos a todas as Irmãs Scalabrinianas que dedicam a vida ao serviço dos migrantes e refugiados ao redor do mundo.

Créditos: Acervo Pessoal

Essa carta, que tenho emoldurada em minha sala, é um tesouro que simboliza a proximidade e o cuidado do papa com nossa missão. Em outra ocasião, recebi em minha casa uma segunda carta, na qual Francisco, com a ternura de um pai, mencionou que meu convite para almoçar em minha casa fazia todo o sentido. Suas palavras, carregadas de afeto e simplicidade, transmitiam uma mensagem clara: "Estou próximo de você, te ouço, te leio, sou atento ao que queres me dizer. E isso é lindo e é tudo para um servo do Senhor. E, recebi, há duas semanas, uma carta datada de 30 de novembro de 2024. Três cartas de um Papa, as quais me animam e me comprometem no serviço à Igreja e reforçam o laço espiritual que nos une em nossa dedicação à construção do Reino de Deus.

Francisco, um defensor da paz

Incansável defensor da paz, sua voz ressoa como um chamado urgente em um mundo marcado por conflitos, divisões e violência. Para ele, a paz não é apenas a ausência de guerra, mas um estado de harmonia que nasce da justiça, do diálogo e do respeito pela dignidade de cada ser humano. Francisco não se cansa de repetir que a "guerra é sempre uma derrota para a humanidade" e que "quem ganha com a guerra são os produtores de armas". Com essa afirmação contundente, ele expõe as raízes econômicas e políticas que alimentam os conflitos, denunciando a lógica perversa que transforma a dor humana em lucro.

Seu sonho de paz vai além dos discursos; é um convite à ação. Ele nos lembra que a paz é construída no dia a dia, através de pequenos gestos de reconciliação, de escuta atenta e de solidariedade. Em suas viagens a países devastados pela guerra, como o Sudão do Sul e a República Centro-Africana, Francisco não apenas levou uma mensagem de esperança, mas também se colocou como mediador e promotor de diálogos difíceis. Sua presença nesses lugares é um testemunho vivo de que a paz é possível, mesmo nas situações mais desesperadoras.

Além disso, o Papa Francisco insiste que a paz começa no coração de cada pessoa. Ele nos convida a combater a "cultura do descarte" e a "globalização da indiferença", que nos tornam insensíveis ao sofrimento dos outros. Para ele, a paz autêntica só pode florescer quando reconhecemos que somos todos irmãos e irmãs, membros de uma única família humana. Essa visão está profundamente enraizada na fé cristã, mas também ressoa com pessoas de todas as crenças e culturas, tornando Francisco um líder global na promoção da paz.

Em um mundo onde as divisões parecem cada vez mais profundas, o sonho do Papa Francisco com a paz é um farol de esperança. Ele nos desafia a não nos acomodarmos diante da injustiça e a sermos artífices de reconciliação, construindo pontes onde há muros e semeando amor onde há ódio. Como ele mesmo diz, "a paz é um dom precioso, que deve ser promovido e protegido". E esse dom, segundo Francisco, está ao alcance de todos nós, se estivermos dispostos a trabalhar por ele.

Papa Francisco, um líder coerente que inspira a ação

Enfim, o Papa Francisco é, acima de tudo, um líder que inspira pela coerência entre suas palavras e ações. Sua humanidade, sua atenção aos detalhes, sua defesa das mulheres, sua preocupação com o meio ambiente, sua preocupação com a paz e sua visão de uma Igreja sinodal e em saída são testemunhos vivos de uma fé que se faz ação. Minhas experiências com ele, desde o trabalho na Rádio Vaticano até os encontros pessoais e as cartas recebidas, me mostram que Francisco não é apenas um guia espiritual, mas um exemplo de como viver o Evangelho no mundo de hoje.

Ele é, de fato, um Papa fora da curva. Rompe com todos os esquemas humanos que impedem a fluidez do amor de Deus que anseia por se revelar ao mundo. Ao querido e amado Papa Francisco, toda a minha reverência, todo o meu respeito e um sincero obrigada por me ensinar a buscar a Deus e a encontrá-Lo. Saúde e vida longa Francisco. Num mundo sem referências que nos leve a Deus, Sua Santidade é o farol que nos indica o caminho que leva a Jesus. Te amo! (lágrimas de emoção, alegria e gratidão).

Rosa Maria Martins-Silva
Natural de Inhapim, Minas Gerais. Atua como Missionária Scalabriniana a serviço dos migrantes e refugiados. Licenciou-se em Filosofia, Teologia e Jornalismo. Mestra em Comunicação Social, atuou por diversos anos na Conferência Nacional dos Religiosos do Brasil (CRB Nacional), onde criou o setor de Comunicação. Trabalhou no Dicastério para a Comunicação (Rádio Vaticano). Vencedora do Prêmio CNBB de Comunicação (Prêmio Papa Francisco de Mestrado). Assessora a Vida Religiosa Consagrada com foco na comunicação como ferramenta de transformação da vida comunitária.


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/testemunhos/francisco-um-papa-fora-da-curva/

10 de março de 2025

Caridade, um dos pilares fundamentais da santidade

"Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e a caridade, estas três, mas a maior delas é a caridade" (1Cor 13,13)

Paulo faz uma distinção clara da importância da caridade na vida do cristão. Ainda assim, muitas vezes, essa necessidade espiritual passa despercebida, pois o demônio está constantemente tentando convencer as pessoas a se afastarem dessa virtude.

Créditos: Fatebenefratelli/Domínio Público

A caridade segundo o Catecismo da Igreja Católica:

"[…] Nosso Senhor adverte-nos de que seremos separados d'Ele, se descurarmos as necessidades graves dos pobres e dos pequeninos seus irmãos." (CIC §1033)

Ao seguir a lei de Deus, o homem agrada diretamente o coração d'Ele, a caridade pode ser referenciada como respeito direto aos mandamentos mais importantes, pois, segundo o catecismo, "a caridade é a virtude teologal pela qual amamos a Deus sobre todas as coisas por Ele mesmo e ao próximo como a nós mesmos por amor de Deus" (CIC §1822).

"Se vês a caridade, vês a Trindade"

Santo Agostinho confirma, com essa frase, o que já foi mencionado anteriormente: com a caridade, estamos unidos a Deus, pois é isso que Ele espera dos homens — o abandono do egoísmo, do orgulho e da soberba, e a vivência da caridade, do amor e da humildade.

Agostinho também disse: "Dois amores fundaram duas cidades: o amor de Deus até o desprezo de si mesmo fez a Cidade de Deus; o amor de si mesmo até o desprezo de Deus fez a cidade dos homens".

A grande virtude do cristão

São Tomás de Aquino ensina que a caridade é a forma de todas as virtudes, ou seja, a virtude que dá sentido e finalidade às demais. Assim, a caridade deve ser o motor da vida em Deus, pois é a partir dela que o homem crescerá nas demais virtudes.

Entretanto, esse não é o único benefício espiritual que a caridade carrega. Assim como o jejum e a penitência, a caridade é uma ferramenta fundamental para vencer o pecado. Nas palavras de São Pedro: "Sobretudo, tende ardente caridade uns para com os outros, porque a caridade cobre a multidão dos pecados." (1Pd 4,8)

Exemplo na vida de São João de Deus

São João de Deus viveu uma vida muito conturbada e não encontrava objetivos concretos para si. Desde muito cedo, levou uma vida nômade, especialmente após servir no exército. Ele não conseguia se estabelecer em lugar algum e, assim, vivia uma existência vazia. Isso mudou quando se tornou livreiro, profissão pela qual se apaixonou. Além disso, fortaleceu sua vida de oração por meio da leitura.

No entanto, o verdadeiro sentido de sua vida ainda estava por vir. Ao ouvir um sermão, João ficou profundamente tocado, a ponto de adoecer. Após sair do hospital, vendeu tudo o que possuía e dedicou sua vida aos pobres.

"Fazei bem, irmãos, a vós mesmos, ajudando os pobres."

João teve uma experiência marcante nos hospitais psiquiátricos, antigamente chamados de manicômios. Lá, ele se aproximou daqueles considerados pacientes sem cura, muitos dos quais haviam sido abandonados por suas próprias famílias.

Embora não tivesse conhecimento médico, João adotou uma abordagem diferente. Ele acreditava que a cura do corpo passava pela cura da alma. Naquela época, os médicos frequentemente recorriam a métodos dolorosos e torturantes. João, ao observar essa realidade, decidiu agir de maneira oposta: em vez de infligir sofrimento, buscava dialogar com os doentes e levar Deus a eles. Muitas vezes, essa atenção e acolhimento eram exatamente o que os pacientes precisavam, mas não recebiam.

São João de Deus, por meio de sua caridade ao abandonar tudo, cresceu espiritualmente, e Deus lhe concedeu a capacidade de atender aqueles que mais necessitavam. Os frutos dessa decisão podem ser vistos até os dias de hoje. João de Deus fundou uma ordem hospitaleira que continua seu serviço pelo mundo, estando presente em mais de 53 países.

De fato, ele é um exemplo de como a caridade pode transformar vidas, mostrando que ela não apenas cura o corpo, mas também a alma, um importante motor para a vida espiritual dos cristãos.

Matheus Eleutério – estudante de jornalismo


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/caridade-um-dos-pilares-fundamentais-da-santidade/

8 de março de 2025

Mulher em transformação: transformando-se segundo o coração de Deus

Fluidez e fé, a mulher moderna em busca de sentido numa sociedade líquida

Diante do mundo contemporâneo, com muitas mudanças, este artigo propõe uma reflexão para entender de que forma a mulher moderna está sendo influenciada pelas transformações da sociedade atual, a qual tem sido um fator gerador de mal-estar na nossa civilização e um risco para não viver na Vontade de Deus, dificultando o seu processo de transformação para se tornar uma mulher segundo o coração de Deus.

Crédito: andreswd/GettyImages

O sociólogo Zygmunt Bauman também se preocupou com a questão da modernidade, definindo-a como "sociedade líquida": "Vive-se uma espécie de modernidade líquida, fluida e com um consumismo exacerbado. O que importa é consumir sem pensar nas consequências das compulsões estimuladas pelo mundo moderno. Essas compulsões levam cada vez mais à individualidade. A mulher contemporânea tornou-se o retrato fiel desse consumismo exacerbado. Ao mesmo tempo, vive uma incessante busca por um corpo perfeito. Como se vivêssemos uma doença coletiva, cresce exponencialmente o uso de medicações como ansiolíticos e antidepressivos, com frequência decorrentes da intolerância ao sofrimento."

Niilismo, a ameaça silenciosa à mulher contemporânea

Outro agravante da mulher moderna é que muitas estão perdidas, sem rumo, vivendo sem sentido, o perigo do niilismo. 


O niilismo é a negação de sentido. O Papa João Paulo II nos explicou na Encíclica Fé e Razão: "Como consequência da crise do racionalismo, apareceu o niilismo. Enquanto filosofia do nada, consegue exercer um certo fascínio sobre os nossos contemporâneos. Na interpretação niilista, a existência é somente uma oportunidade para sensações e experiências onde o efémero detém o primado. O niilismo está na origem duma mentalidade difusa, segundo a qual não se deve assumir qualquer compromisso definitivo, porque tudo é fugaz e provisório." 

Santa Teresa d'Ávila, inspiração para a mulher de Deus

Então, qual é o segredo para, de fato, nos tornarmos uma mulher segundo o coração de Deus? 

Podemos aprender com a vida de Santa Teresa d'Ávila, que, embora tenha entrado jovem no Carmelo, só com quase 40 anos de idade foi que ela teve a sua "segunda conversão". Tendo sido uma mulher santa em seus últimos anos, seus anos mais jovens foram tudo, menos perfeitos.

A mesma transformação que aconteceu na vida de Teresa precisa acontecer na nossa. Ela nos ensina que a nossa vocação é amar: "É somente o amor que dá valor a todas as coisas".

Transcrevo um trecho do meu livro "Mulheres em Transformação – Pérolas Preciosas de Deus": Nós, obras-primas do Criador, estamos nas habilidosas mãos do Senhor, que sabe quem somos e o que Ele planejou que sejamos. Não importa o quão danificadas estejamos pelo pecado, é possível a restauração. O Artista-Mestre trabalha em nós. Como São Paulo nos ensina: "Vós vos despistes do homem velho com os seus vícios, e vos revestistes do novo, que se vai restaurando constantemente à imagem daquele que o criou, até atingir o perfeito conhecimento" (Cl 3,9-10). 

O Espírito Santo quer agir na minha vida e na sua, transformando-nos em mulheres segundo o coração de Deus.

Marina Adamo


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/mulher-em-transformacao-transformando-se-segundo-o-coracao-de-deus/

7 de março de 2025

Como a adoração pode ser um remédio para nossa alma?

A cura através da adoração

A adoração é um encontro direto com Deus. Ao dedicar momentos à Sua presença, experimentamos cura e transformação interior. Esse tempo de oração e silêncio ajuda a afastar o barulho do mundo e a concentrar nossa atenção naquilo que realmente importa.

Crédito: Sidney de Almeida/GettyImages

Foco na presença de Deus

Quando adoramos, colocamos de lado as preocupações cotidianas. É uma oportunidade de parar e reconhecer que nossa força vem de Deus. Esse reconhecimento traz paz e alívio para os fardos que carregamos.

Transformação interior

A prática regular da adoração fortalece a fé e acalma a mente. Em momentos de silêncio, somos convidados a refletir sobre nossas atitudes e a buscar mudanças que nos aproximem do amor de Cristo. Essa renovação fortalece nossa esperança e nos prepara para enfrentar desafios.


Cura para a alma

O encontro com o Senhor através da adoração não é apenas um momento de contemplação; é um remédio que alivia dores emocionais e espirituais. Ao sentir a presença de Deus, encontramos conforto e um caminho para a superação das crises pessoais. É na simplicidade desse encontro que muitos experimentam uma verdadeira cura.

Aplicação prática na vida diária

  • Reserve um tempo diário para a adoração, mesmo que por alguns minutos.
  • Utilize este momento para refletir sobre sua vida com Deus e tudo o que tem vivido

Conclusão

A adoração é um remédio eficaz para nossas almas, pois nos reconecta com a fonte de nossa vida e do nosso sentido de vida. Ao buscar esse encontro sincero com Deus, sua presença, abrimos espaço para a transformação pessoal e para a cura interior.  Na prática, pode parecer uma ferramenta simples, mas poderosa; o que ocorre, de fato, é que nos ajuda a viver uma fé mais autêntica e plena.

Almir Rivas – @rivasalmir
Missionário da Comunidade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/comportamento/como-a-adoracao-pode-ser-um-remedio-para-nossa-alma/

6 de março de 2025

Cultivar a alegria


"Não entregues tua alma à tristeza…" (Eclo 30, 22). De todos os sentimentos, para mim, o mais difícil de vivenciar é a tristeza. A alegria sempre foi natural na minha alma. Desde a infância, sempre gostei muito de cultivar a alegria, de fazer as pessoas próximas rirem também. Até a saudade, as dores da perda são, na minha vida, mais leves que a tristeza.

A outra face do sofrimento deve ser o sorriso

"A alegria do coração é a vida do homem, um inesgotável tesouro de santidade" (Eclo 30, 23). Santa Tereza de Calcutá escreveu em uma de suas cartas que "o meu segundo propósito é o de tornar-me uma apóstola da alegria (…) – Quero sorrir – mesmo para Jesus – e assim ocultar mesmo a Ele – se possível – a dor e a escuridão da minha alma."*  

A alegria é um dom e, como todos os dons, vem de Deus. Acredito que o sofrimento deve ter, como outra face, o sorriso. Se assim procedemos, dizemos a Deus que aceitamos o fardo. Se não, parece que ficamos devendo alguma coisa a Cristo, como se a vontade Dele fosse aceita por mim somente por obrigação. Claro que não é fácil sorrir nos reveses da vida. Mas é uma decisão que podemos tomar e é o melhor caminho para viver e ser feliz.

O sorriso me liberta das minhas dores

Santa Teresinha do Menino Jesus disse: "O coração é meu, pode sofrer. O rosto é do meu irmão, deve sorrir." E ela teve a alegria como um mandamento de vida. Muitas vezes chorei sorrindo e meu sorriso me consolou. Meus olhos expressam minhas dores, mas meu sorriso me liberta delas. Sorrir diz primeiro a mim, que é necessário lutar, não se entregar; e depois diz ao irmão que vale a pena viver e carregar no bolso um sorriso para distribuir nos momentos em que a desesperança bate à porta, "pois a tristeza matou a muitos e não há nela utilidade alguma" (Eclo 30, 25). Então sorrio e, como consequência, colho frutos de alegria, fonte de juventude e leveza da alma, de esperança, de força, de aceitação…   

Assim sendo, sorrindo mesmo sofrendo, vejo a face de Jesus na minha frente, que sofreu com a serenidade e a alegria de quem sabe onde estão escondidos seus tesouros.

Nem as piores dores são inconciliáveis com a alegria

Vejo que ser feliz, independentemente das dificuldades que enfrentamos, é um grande amadurecimento. Uma alma preparada e forte aprende que nem as piores dores são inconciliáveis com o dom da alegria e com a paz que ele proporciona.

A alegria deve ser premente e deve sempre remeter-nos à lembrança da finitude da vida, da inconstância dos dias, da certeza de que aqui não é lugar de repouso ou de descanso das dores e das dificuldades… Aqui é lugar de luta, de romper cárceres, de aprofundar no mais íntimo da alma, do coração e ali encontrar Deus… Minha maior alegria… Que seja a sua também!

*Venha, seja Minha luz – os escritos privados as santa de Calcutá. Ed. Petra, pág. 180.

Viviani Melo Membro de aliança da Comunidade Mel de Deus


Fonte: https://meldedeus.com/a-alegria/

Santa Rosa de Viterbo, a pequena gigante da fé

A fé inquebrável de Santa Rosa de Viterbo

Rosa é prova e testemunho para nós de que mesmo uma vida breve e simples pode ser extraordinária e admirável, influenciando milhares de pessoas no transcorrer dos séculos. Sua fé, enraizada no amor, dava-lhe autenticidade. Todos sabiam que ela pregava sobre aquilo em que firmemente acreditava, sobre aquilo que vivia, sobre aquilo que sinceramente amava e sentia.

Crédito: Bartolome Esteban / Domínio Público

Um nascimento excepcional

Seu nascimento já indicava algo excepcional, pois quem nascia com o esterno – osso na parte anterior do tórax – era condenado a morrer em três anos, porque seu esqueleto não consegue ser sustentado. No entanto, Rosa viveu 18 anos, sempre com o sorriso nos lábios.

Isso fez-me lembrar o que nos ensinava Monsenhor Jonas Abib: ele dizia a nós, missionários da Canção Nova, que teríamos um hábito (ou seja, um vestimento religioso diferenciado), mas que o nosso hábito, o que nos distinguiria como Canção Nova, seria nosso sorriso. O sorriso é algo poderoso e muito evangelizador, pois nos acolhe sem julgamentos.

Rosa, não podendo receber o hábito religioso, entrou para a Ordem Terceira de São Francisco e começou a percorrer toda a cidade, com uma cruz no pescoço, levando uma vida de penitência e de caridade com os pobres e enfermos.

Um contexto de conflitos

Rosa viveu numa época de grandes confrontos entre os poderes do pontificado e do imperador, somados aos conflitos civis provocados por duas famílias que disputavam o governo da cidade de Viterbo. Ela nasceu nesta cidade num dia incerto do ano de 1234. Os pais, João e Catarina, eram cristãos fervorosos. Então, o contexto social e histórico era muito conflituoso.


Rosa teria muitas justificativas para explicar sua impossibilidade de fazer algo pelo outro. Mas ela não se deu por vencida, pois quem tem seu coração verdadeiramente abrasado pelo amor de Deus não consegue se conter e sente uma imperiosa necessidade de levar esse amor a outros. Como sua mãe, Catarina, trabalhava com as Irmãs Clarissas do mosteiro da cidade, Rosa recebeu a influência da espiritualidade franciscana ainda muito pequena.

Dons especiais e amor incondicional

Ela era uma criança carismática, possuía dons especiais e um amor incondicional ao Senhor e a Virgem Maria. Dizem que, com apenas três anos de idade, transformava pães em rosas e, aos sete, pregava nas praças, convertendo multidões. Aos doze anos, ingressou na Ordem Terceira de São Francisco por causa de uma visão em que Nossa Senhora assim lhe determinava.

Defesa da fé e exílio

No ano de 1247, a cidade de Viterbo, fiel ao Papa, caiu nas mãos do imperador Frederico II, um herege que negava a autoridade do Papa e o poder do Sacerdote de perdoar os pecados e consagrar. Lembrando que o próprio Jesus deixou bem claro para Pedro o poder de ligar e desligar nos céus. Está em Mateus 16,19: "Eu lhe darei as chaves do Reino dos Céus; o que você ligar na terra terá sido ligado nos céus; e o que você desligar na terra terá sido desligado nos céus".

Rosa teve outra visão, desta vez com Cristo, que estava com o coração em chamas. Ela não se conteve, saiu pelas ruas pregando com um crucifixo nas mãos. A notícia correu toda a cidade, muitos foram estimulados na fé, e vários hereges se converteram. Com suas palavras, confundia até os mais preparados. Por isso, representava uma ameaça para as autoridades locais.

Em 1250, o prefeito a condenou ao exílio. Rosa e seus pais foram morar em Soriano, onde sua fama já havia chegado.

Retorno e morte

Na noite de 5 de dezembro de 1251, Rosa recebeu a visita de um anjo que lhe revelou que o imperador Frederico II, uma semana depois, morreria. O que de fato aconteceu. Com isso, o poder dos hereges enfraqueceu, e Rosa pôde retornar a Viterbo. Toda a região voltou a viver em paz. No dia 6 de março de 1252, sem agonia, ela morreu.

O processo de canonização

No mesmo ano, o Papa Inocêncio IV mandou instaurar o processo para a canonização de Rosa. Cinco anos depois, o mesmo Pontífice mandou exumar o corpo e, para a surpresa de todos, ele foi encontrado intacto. O convento das Irmãs Clarissas, que nesta cerimônia passou a se chamar Convento de Santa Rosa.

Depois dessa cerimônia, a Santa só foi "canonizada" pelo povo, porque, curiosamente, o processo nunca foi promulgado. A canonização de Rosa ficou assim, nunca foi oficializada. Mas também nunca foi negada pelo Papa e pela Igreja. Santa Rosa de Viterbo, desde o momento de sua morte, foi "canonizada" pelo povo.

Um legado de fé

Sua vida demonstra a força e a luz de alguém que abraça a fé com determinação e plenitude. A presença de Deus nessas almas torna-se palpável e concreta para aqueles que as circundam. Aprendamos com Santa Rosa a abraçar a fé com firmeza e integridade, não importa as circunstâncias que nos cerquem.

Santa Rosa de Viterbo, rogai por nós!

Edvânia Duarte Eleutério
Missionária da Comunidade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/igreja/santos/santa-rosa-de-viterbo-pequena-gigante-da-fe/

5 de março de 2025

Conversão e Penitência

– Fomentar a conversão do coração, especialmente durante este tempo.
– Obras de penitência: o jejum, a mortificação, a esmola…
– A Quaresma, um tempo para nos aproximarmos mais de Deus.

I. COMEÇA A QUARESMA, tempo de penitência e de renovação interior para prepararmos a Páscoa do Senhor 1A liturgia da Igreja convida-nos com insistência a purificar a nossa alma e a recomeçar novamente.

Diz o Senhor Todo-Poderoso: Convertei-vos a mim de todo o vosso coração, com jejum, lágrimas e gemidos de luto. Rasgai os vossos corações, não as vossas vestes; convertei-vos ao Senhor vosso Deus, porque ele é compassivo e misericordioso… 2, lemos na primeira leitura da Missa de hoje. E quando o sacerdote impuser as cinzas sobre as nossas cabeças, recordar-nos-á as palavras do Gênesis, depois do pecado original: "Memento homo, quia pulvis es…Lembra-te, ó homem, de que és pó e em pó te hás de tornar 3.

"Memento homo…Lembra-te… E, não obstante, às vezes esquecemos que sem o Senhor não somos nada. "Sem Deus, nada resta da grandeza do homem senão este montinho de pó sobre um prato, numa ponta do altar, nesta Quarta-feira de Cinzas, com o qual a Igreja nos deposita na testa como que a nossa própria substância" 4.

O Senhor quer que nos desapeguemos das coisas da terra para que possamos dirigir-nos a Ele, e que nos afastemos do pecado, que envelhece e mata, e retornemos à fonte da Vida e da alegria: "O próprio Jesus Cristo é a graça mais sublime de toda a Quaresma. É Ele quem se apresenta diante de nós na simplicidade admirável do Evangelho" 5.

Dirigir o coração a Deus, converter-se, significa estarmos dispostos a empregar todos os meios para viver como Ele espera que vivamos, a não tentar servir a dois senhores 6, a afastar da vida qualquer pecado deliberado. Jesus procura em nós um coração contrito, conhecedor das suas faltas e pecados e disposto a eliminá-los. Então lembrar-vos-eis do vosso proceder perverso e dos vossos dias que não foram bons… 7. O Senhor deseja uma dor sincera dos pecados, que se manifestará antes de mais nada na Confissão sacramental: "Converter-se quer dizer para nós procurar novamente o perdão e a força de Deus no sacramento da reconciliação e assim recomeçar sempre, avançar diariamente" 8.

Para fomentar em nós a contrição, a liturgia de hoje propõe-nos o salmo com que o rei David manifestou o seu arrependimento, o mesmo com que tantos santos suplicaram o perdão de Deus.

Tende piedade de mim, Senhor, segundo a vossa bondade. E, segundo a imensidão da vossa misericórdia, apagai a minha iniqüidade, dizemos a Jesus com o profeta real.

Lavai-me totalmente da minha falta e purificai-me do meu pecado. Eu reconheço a minha iniqüidade e tenho sempre diante de mim o meu pecado. Somente contra Vós pequei.

Ó meu Deus, criai em mim um coração puro e renovai-me o espírito de firmeza. Não me expulseis para longe do vosso rosto, não me priveis do vosso santo espírito.

Restituí-me a alegria da salvação e sustentai-me com uma vontade generosa. Senhor, abri os meus lábios a fim de que a minha boca anuncie os vossos louvores 9.

O Senhor nos atenderá se no dia de hoje repetirmos de todo o coração, como uma jaculatória: Ó meu Deus, criai em mim um coração puro e renovai-me o espírito de firmeza.

II. O SENHOR também nos pede hoje um sacrifício um pouco especial: a abstinência e, além dela, o jejum, pois o jejum "fortifica o espírito, mortificando a carne e a sua sensualidade; eleva a alma a Deus; abate a concupiscência, dando forças para vencer e amortecer as suas paixões, e prepara o coração para que não procure outra coisa senão agradar a Deus em tudo" 10.

Além destas manifestações de penitência (a abstinência de carne a partir dos 14 anos e o jejum entre os 18 e os 59 completos), que nos aproximam do Senhor e dão à alma uma alegria especial, a Igreja pede-nos também que pratiquemos a esmola que, oferecida com um coração misericordioso, deseja levar um pouco de consolo aos que passam por privações ou contribuir conforme as possibilidades de cada um para uma obra apostólica em bem das almas. "Todos os cristãos podem praticar a esmola, não só os ricos e abastados, mas mesmo os de posição média e ainda os pobres; deste modo, embora sejam desiguais pela sua capacidade de dar esmola, são semelhantes no amor e afeto com que a praticam" 11.

O desprendimento das coisas materiais, a mortificação e a abstinência purificam os nossos pecados e ajudam-nos a encontrar o Senhor. Porque "quem procura a Deus querendo continuar com os seus gostos, procura-o de noite e, de noite, não o encontrará" 12.

A fonte desta mortificação está principalmente no trabalho diário: nos pormenores de ordem, na pontualidade com que começamos as nossas tarefas, na intensidade com que as realizamos; na convivência com os colegas, que nos deparará ocasiões de mortificar o nosso egoísmo e de contribuir para criar um clima mais agradável à nossa volta. "Mortificações que não mortifiquem os outros, que nos tornem mais delicados, mais compreensivos, mais abertos a todos. Não seremos mortificados se formos suscetíveis, se estivermos preocupados apenas com os nossos egoísmos, se esmagarmos os outros, se não nos soubermos privar do supérfluo e, às vezes, do necessário; se nos entristecermos quando as coisas não correm como tínhamos previsto. Pelo contrário, seremos mortificados se nos soubermos fazer tudo para todos, para salvar a todos (I Cor 9, 22)" 13Cada um de nós deve preparar um plano concreto de pequenos sacrifícios para oferecer ao Senhor diariamente nesta Quaresma.

III. NÃO PODEMOS DEIXAR passar este dia sem fomentar na alma um desejo profundo e eficaz de voltar uma vez mais para Deus, como o filho pródigo, a fim de estarmos mais perto dEle. São Paulo, na segunda leitura da Missa, diz que este é um tempo excelente que devemos aproveitar para nos convertermos: Nós vos exortamos a não receber a graça de Deus em vão […]. Agora é o tempo favorável, agora é o dia da salvação 14E o Senhor nos repete a cada um, na intimidade do coração: Convertei-vos. Voltai-vos para mim de todo o coração.

Abre-se agora um tempo em que este recomeçar em Cristo se irá apoiar numa particular graça de Deus, própria do tempo litúrgico que começamos. Por isso, a mensagem da Quaresma está repassada de alegria e de esperança, ainda que seja uma mensagem de penitência e mortificação.

"Quando algum de nós reconhece estar triste, deve pensar: é que não estou suficientemente perto de Cristo. E o mesmo deve pensar quando reconhece em si uma clara tendência para o mau humor, para a irritação. E não deve pretender jogar a culpa nas coisas que tem à sua volta, pois seria um erro e uma maneira de se desorientar na procura da causa dos seus estados de ânimo" 15.

Às vezes, certa apatia ou tristeza espiritual pode ser motivada pelo cansaço, pela doença…, mas com muito mais freqüência procede da falta de generosidade em corresponder ao que o Senhor nos pede, do pouco esforço em mortificar os sentidos, da falta de preocupação pelos outros. Em resumo, de um estado de tibieza.

Em Cristo encontramos sempre o remédio para uma possível tibieza e as forças para vencer defeitos que de outro modo seriam insuperáveis. Quando alguém diz: "Sou irremediavelmente preguiçoso, não sou tenaz, não consigo terminar as coisas que começo, deveria pensar (hoje): Não estou tão perto de Cristo como deveria.

"Por isso, aquilo que cada um de nós possa reconhecer na sua vida como defeito, como doença, deveria ser imediatamente referido a este exame íntimo e direto: Não sou perseverante? Não estou perto de Cristo. Não sinto alegria? Não estou perto de Cristo. Vou deixar de pensar que a culpa é do trabalho, que a culpa é da família, dos pais ou dos filhos… Não. A culpa íntima é do fato de eu não estar perto de Cristo. E Cristo me está dizendo: Volta. Voltai-vos para mim de todo o coração.

"[…] Tempo para que cada um se sinta urgido por Jesus Cristo. Para que os que alguma vez se sentiram inclinados a adiar esta decisão saibam que chegou o momento. Para que os que estão dominados pelo pessimismo, pensando que os seus defeitos não têm remédio, saibam que chegou o momento. Começa a Quaresma; vamos encará-la como um tempo de mudança e de esperança" 16.

(1) Cfr. Conc. Vat. II, Const. Sacrossanctum Concilium, 109; (2) Joel 2, 12; (3) Gên 3, 19; (4) J. Leclercq, Siguiendo el año litúrgico, Madrid, 1957, pág. 117; (5) João Paulo II, Homilia da Quarta-feira de Cinzas, 28-II-1979; (6) cfr. Mt 6, 24; (7) Ez 36, 31-32; (8) João Paulo II, Carta Novo incipiente, 8-IV-1979; (9) Sl 50, 3-6.12-14.17; (10) São Francisco de Sales, Sermão sobre o jejum; (11) São Leão Magno,Liturgia das Horas. Segunda leitura da quinta-feira depois das Cinzas; (12) São João da Cruz, Cântico espiritual, 3, 3; (13) São Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, 3ª ed., Quadrante, São Paulo, n. 9; (14) 2 Cor 5, 20; Segunda leitura da Missa da Quarta-feira de Cinzas; (15) A. M. García Dorronsoro, Tiempo para creer, pág. 118; (16) ib.

Fonte: Livro "Falar com Deus", de Francisco Fernández Carvajal


Fonte: https://institutohesed.org.br/conversao-e-penitencia-2/