17 de setembro de 2025

Quando o sorriso esconde a dor

Era um daqueles sábados de atendimento quando chegou uma família completamente assustada: um adolescente havia tentado contra a própria vida. Dizia não ter mais vontade de viver, não encontrava sentido, embora, nas reuniões familiares e nos encontros com os amigos, parecesse alguém alegre. Recordei do Salmo 25,16-17 que diz: "Olhai para mim e tende piedade de mim, pois estou só e aflito. As angústias do meu coração se multiplicaram; livrai-me da minha aflição". Esta passagem é um pedido de auxílio e misericórdia a Deus, expressa a solidão e sofrimento, e pede a Deus para ser liberto das suas tribulações.

Acolhimento e prevenção, chaves para ajudar ao sofrimento humano

Créditos: PeopleImages by Getty Images / cancaonova.com

Quase sempre, quando acontece isso, as pessoas esperam que o padre faça uma oração, que se "doutrine" quem pensa em suicídio e que isso mude tudo. Mas a oração não é mágica capaz de, num estalar de dedos, arrancar o sentimento de rejeição, a dor ou o desejo de isolamento. Como tudo na vida, isso exige um processo.

A importância da escuta atenta e ativa

Nesses casos, o meu procedimento foi sempre ouvir cada parte separadamente. Uma escuta atenta e ativa. Primeiro, ouvi o adolescente: deixei que falasse tudo o que sentia, sem julgamentos ou pré-conceitos. Em seguida, ouvi os tutores e os avós — atentos ao cuidado que prestavam desde a morte dos pais. No final, perguntei: "Ele nunca demonstrou nada?" Responderam: "Não, padre! Sempre foi uma pessoa maravilhosa, nunca nos deu trabalho; não sai com os amigos, fica no quarto, não nos dá trabalho nenhum".

Foi aí que acendeu o meu alerta. O silêncio e a timidez daquele jovem já eram sinais de algo que precisava ser trabalhado. Penso no termo "desembrulhar": sabe quando um novelo de linha está todo embrulhado? É preciso encontrar a ponta e, com paciência, ir desenrolando até a linha ficar organizada de novo. Assim acontece com muitos que atravessam depressão, síndrome do pânico, sentimento de rejeição — dramas internos que fazem com que não vejam outra saída senão tirar a própria vida. No fundo, não é a vida que desejam matar, mas o sofrimento que ela lhes causa. Em algum momento, perdem a paciência de desenroscar os fios trançados de seus dramas e dizem: "Chega, cansei disso".

Aceitação e confiança em programas pré-estabelecidos

Todo sentimento de impaciência vem acompanhado de sinais sutis, percebidos apenas por quem não se contenta com padrões. E esse é um dos problemas da nossa sociedade: habituamo-nos a aceitar padrões — de beleza, de felicidade — e confiamos em programas pré-estabelecidos, como máquinas. Não por acaso, nossa relação com o mundo tem-se voltado para interações mediadas por tecnologia e inteligência artificial, sistemas que reproduzem padrões e oferecem uma sensação de estabilidade e segurança.

Ao nos apegarmos a esses padrões, perdemos a força das relações humanas. Aceitamos que, se alguém sorri em uma foto, está feliz, sem notar os pequenos sinais do cotidiano — sinais que só vemos quando temos coragem de romper os padrões e olhar além.


Nenhuma máquina substituirá o humano

Enquanto escrevia este texto, pensei se devia alertar sobre os perigos das novas tecnologias ou resgatar a importância das relações humanas, únicas para cada pessoa e fundamentais para a valorização da vida.

Nenhuma máquina substituirá o humano, por mais revolucionárias que sejam as novas tecnologias. Mesmo que a inteligência artificial facilite muitas tarefas de busca e pesquisa, olhar nos olhos, ouvir o silêncio e entender as pausas é o que gera empatia e interação real.

Padre Robson Caramano
Padre da Diocese de São Carlos, Mestre em Linguagens, Mídia e Arte pela PUC Campinas e aluno do Programa de Mestrado em Filosofia com Especialização em Filosofia Prática da Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma. Coordenação do Departamento de Comunicação do Pontifício Colégio Pio Brasileiro.


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/quando-o-sorriso-esconde-dor/

15 de setembro de 2025

Pascom e a comunicação a serviço da ação evangelizadora da Igreja

Como implantar a Pastoral da Comunicação na vida das paróquias e comunidades?


Para implantar a Pascom em uma paróquia, precisamos compreender a relevância da comunicação na Igreja e o seu principal objetivo.

A Pascom tem como objetivo anunciar a Palavra de Deus por meio dos instrumentos de comunicação, tendo como base seus quatro pilares: espiritualidade, formação, articulação e produção.

A Igreja reconhece a importância da comunicação, como nos mostra o número 202 do Diretório de Comunicação da Igreja no Brasil, que considera imprescindível a participação católica na promoção da cultura no âmbito da mídia, com atenção especial aos conteúdos religiosos.

O Guia de Implantação da Pastoral da Comunicação da Pascom Brasil, nos fala que:

"Ela favorece o cultivo do ser humano enquanto pessoa que comunica valores, vivenciados a partir da Palavra de Deus e da Eucaristia, pois o anúncio sempre deve ser acompanhado do testemunho".

O texto ainda afirma que a Pastoral da Comunicação é a pastoral do ser e estar em comunhão com toda a comunidade, cujo instrumento para exercer a missão é trabalhar por meio das mediações que podem proporcionar o fortalecimento dessa comunhão.

E chegamos a um ponto importante da nossa reflexão: quais os passos que devemos seguir para implantar a Pascom na vida paroquial e comunitária?

É o que veremos a seguir.

Desfazendo os mitos da Pastoral da Comunicação
Implantar a Pastoral da Comunicação pode ser um grande desafio, principalmente se os agentes não compreendem o verdadeiro significado da comunicação dentro da comunidade.

Então, vamos desfazer alguns "mitos" que envolvem a Pascom:

Nunca trabalhei com comunicação

Não há problema se você não trabalha na área de comunicação, o importante é ter o desejo de usar os recursos da comunicação para evangelizar. Lembre-se: Jesus não fez exigências para escolher seus Apóstolos.

Não preciso de Pascom porque na minha paróquia tem muitos idosos

Toda forma de comunicação, sejam elas folhetos, cartazes, mural, pode ser articulada pelos agentes da Pascom, pois comunicar vai além da tecnologia e das redes sociais.

 Não tenho tempo para formações ou momentos de oração

É comum que o acúmulo de atividades possa acabar fazendo com que a dinâmica da Pascom se torne mecanizada. Por isso, tenhamos cuidado: se não há espiritualidade e momentos de formação, a vida pastoral perde o sentido e a sua essência.

 Não tenho como saber sobre os eventos da paróquia

A Pascom é responsável por articular as pastorais e movimentos da comunidade. Por isso, é preciso criar canais que liguem a Pascom e as pastorais para que possam ampliar a divulgação dos eventos e, ao mesmo tempo, fortalecer os laços de união entre todos.

Dicas práticas para implantar a Pascom
  • Conheça a realidade local: converse com o pároco, os paroquianos e os coordenadores pastorais para entender a realidade da paróquia.
  • Forme uma equipe: convide pessoas comprometidas e que tenham o desejo de evangelizar através dos meios de comunicação.
  • Faça um planejamento estratégico: é preciso reunir a equipe para elaborar as atividades da Pascom, de acordo com a realidade da paróquia.
  • Utilize múltiplas plataformas: diversifique os canais de comunicação, como o boletim paroquial, redes sociais, site da paróquia, entre outras ferramentas, pois permite levar a palavra de Deus para mais pessoas.
  • Não se esqueça da vida de oração individual e comunitária: é fundamental cultivar a espiritualidade e a participação ativa na comunidade.

Mãos à obra!

Renan Dantas – Seminarista da Diocese de Juína, Jornalista e Fotógrafo profissional e Redator do GT de Produção da Pascom Brasil

Devolver esperança enxugando lágrimas

O Papa Francisco anunciou que o Jubileu de 2025 terá o tema "Peregrinos da Esperança", com base na passagem "A esperança não decepciona" (2 Cor 6,2) e se concentra em promover a paz, a cura e a fraternidade. Ele será uma oportunidade para os católicos renovarem sua fé e compromisso com os valores cristãos.

Créditos: Delmaine Donson by Getty Images.

Entre as diversas celebrações do Jubileu, no dia 15 de setembro, haverá uma celebração em Roma em que estão convidados todos aqueles que estão vivendo momentos de dor e aflição devido à doença, ao luto, à violência, aos abusos sofridos e outros sofrimentos da vida.

O Jubileu nos dá a oportunidade de reavivar a nossa fé na "esperança que não decepciona", lembrando-nos de que a beleza da vida supera todas as suas dores quando vivemos na fé do Cristo e da Igreja. O tema "Peregrinos da Esperança" é um convite para que os fiéis renovem sua fé, voltem-se para a misericórdia de Deus e encontrem sentido mesmo nos momentos mais difíceis da vida como os citados acima.

O Jubileu é profundamente solidário com os sofrimentos da humanidade

Ao mesmo tempo em que o Jubileu é tempo de festa e renovação espiritual, ele também é profundamente solidário com os sofrimentos da humanidade. A Igreja reconhece que muitos atravessam momentos difíceis que só podem ser superados com a solidariedade humana e com a graça de Deus. O Jubileu quer abraçar os que sofrem com gestos concretos de misericórdia, oração e reconciliação. O Papa Francisco insistia que a Igreja deve ser um "hospital de campanha", especialmente atenta aos feridos da vida.

Neste tempo de graças e de misericórdia, a Igreja nos propõe voltar-se para Deus no silêncio do coração, mesmo na dor; participar dos Sacramentos, em especial a Reconciliação e a Eucaristia, como fontes de cura; acolhimento comunitário; ação misericordiosa no sentido de ajudar os que sofrem; oração pelos que sofrem.

O Jubileu quer ser um tempo de consolo para os aflitos, esperança para os desanimados e renovação para os que caminham com feridas abertas. Ele nos lembra que Deus caminha conosco, não só nos momentos de glória, mas também no vale escuro das lágrimas.

A Palavra de Deus nos fortalece na fé e na esperança

Neste sentido, a Palavra de Deus é valiosíssima para nos fortalecer na fé e na esperança. Vale a pena recordar a todos que passam pelos momentos difíceis da vida algumas passagens bíblicas que fortalecem a nossa fé como em Romanos 8,18 – "Tenho para mim que os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a glória que há de ser revelada em nós". O sofrimento é passageiro mas a vida eterna é para sempre.

São Paulo disse aos coríntios: "Em tudo, somos atribulados, mas não angustiados; perplexos, mas não desanimados; perseguidos, mas não abandonados; abatidos, mas não destruídos". (2 Cor 4,8-9). Deus está presente conosco mesmo na dor, que se torna salvífica produzindo a salvação em quem sofre na fé, unindo seu sofrimento com o de Cristo na Cruz. Por isso disse São Tiago: "Considerai como grande alegria, meus irmãos, quando tiverdes de passar por diversas provações. Pois sabeis que a prova da vossa fé produz perseverança. (Tiago 1,2-4).

O sofrimento é caminho de crescimento espiritual, por isso São Paulo diz que "tudo concorre para o bem dos que amam a Deus" (Rom 8,28) e que, portanto, devemos "dar graças a Deus em todas as circunstâncias" (1 Tess 5,17).

Não damos graças pelo mal em si, mas pelo bem que Deus sabe tirar do mal. Santo Agostinho disse que Deus não permitiria o mal entrar no mundo se Ele não soubesse do mal tirar o bem. É bom lembrar que o maior mal cometido pela humanidade – a morte cruenta de Jesus – produziu a salvação da humanidade.

O Jubileu nos faz lembrar que Cristo venceu o mundo

O salmista diz que: "O Senhor está perto dos que têm o coração ferido, e salva os de espírito abatido" (Sl 34,19). O mesmo dizia Deus pelo profeta Isaías (41,10): "Não temas, porque eu estou contigo; não te assustes, porque eu sou teu Deus. Eu te fortaleço, te ajudo e te sustento com minha mão fiel". Deus dá força e sustento, mesmo quando tudo parece perdido.

O Jubileu nos faz lembrar o que disse Jesus aos Apóstolos na Santa Ceia: "No mundo tereis tribulações. Mas tende coragem: eu venci o mundo!" (João 16,33). Cristo não nega os sofrimentos que nos atingem, mas dá esperança e vitória: Ele venceu o mundo. "Ainda que eu atravesse o vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque estás comigo. Teu bastão e teu cajado me confortam" (Salmo 22).

São Pedro nos lembra que: "Depois de terdes sofrido um pouco, o Deus de toda a graça, que vos chamou à sua glória eterna em Cristo, vos restaurará, vos confirmará, vos dará força e vos firmará sobre fundamentos sólidos."(1Pe 5,10). "Tudo posso naquele que me fortalece" (Fil 4,13).

Essas e outras citações nos ajudam a resistir na fé em meio aos sofrimentos. E mais, São Paulo nos garante que: "Não vos sobreveio tentação alguma que ultrapasse as forças humanas. Deus é fiel: não permitirá que sejais tentados além das vossas forças, mas com a tentação, ele vos dará os meios de suportá-la e sairdes dela" (1 Cor 10,13).



Felipe Aquino

Professor Felipe Aquino é viuvo, pai de cinco filhos. Na TV Canção Nova, apresenta o programa "Escola da Fé" e "Pergunte e Responderemos", na Rádio apresenta o programa "No Coração da Igreja". Nos finais de semana prega encontros de aprofundamento em todo o Brasil e no exterior. Escreveu 73 livros de formação católica pelas editoras Cléofas, Loyola e Canção Nova. Página do professor: www.cleofas.com.br e Twitter: @pfelipeaquino


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/devolver-esperanca-enxugando-lagrimas/

14 de setembro de 2025

O amor revelado no madeiro

Caminho de vida

Em sua morte de Cruz, Cristo demonstra todo o seu amor por nós: "E quando eu for levantado da terra, atrairei todos os homens a mim" (Jo 12,32). Dando-se em Sacrifício por amor, Cristo nos atrai, nos resgata para si. Quando mergulhamos com a alma na riqueza deste gesto de Jesus, entendemos um pouco mais a profundidade da sua doação: "Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a sua vida por seus amigos" (Jo 15,13).

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Foto ilustrativa: Bruno Marques/cancaonova.com

A mensagem da Cruz é para todos os tempos. É sempre uma novidade para nós olhar para Cristo e, mais do que entender, deixarmo-nos surpreender com o que Ele tem a realizar em nós a partir de sua Cruz. 

A cruz: sinal de amor, confiança e vitória

Para os cristãos, a Cruz — símbolo de humilhação, tortura e objeto de intimidação do Império Romano — é sinal de amor, de confiança e vitória. É a certeza de que a morte foi vencida e de que o pecado não tem o poder de nos aprisionar. Ele foi derrotado na Cruz. Por suas chagas, fomos sarados A crucifixão de Jesus foi um ato solene de redenção que, com sua ressurreição, realiza de uma vez por todas o plano de salvação de Deus.


No entanto, não podemos ignorar o sofrimento real de Jesus na Cruz. E aí está a grandeza desse sinal: na dor de Cristo, está a nossa alegria. O capítulo 53 do livro do profeta Isaías nos apresenta a figura do Servo Sofredor, atribuída a Cristo. O profeta fala de um homem de Deus que carregava em si os sofrimentos de outros.

Na Cruz, Jesus carrega todos os nossos sofrimentos 

E que sofrimentos eram estes? Todos os que podemos imaginar! Ele toma nossas doenças, pecados, dores e mazelas para si, ou seja, leva sobre os ombros os sofrimentos que trazemos. Isaías deixa bem claro o que Jesus estava fazendo e qual era o intuito daquele sofrimento: "Fomos sarados com os seus ferimentos" (v.5). De fato, na Cruz não havia seleção. Eram, absolutamente, todos os sofrimentos humanos — de quem veio e de quem virá ao mundo — que estavam na Cruz de Cristo.

Portanto, a sua dor, seja ela qual for, até mesmo aquela que você ainda vai sentir, estava no madeiro. É por isso que não há mal que Jesus não possa vencer. E Ele fez tudo isso voluntariamente. Não foi uma oferta obrigatória. Por isso "não abriu a sua boca" (v.7), não reivindicou defesa. Nisso está o seu triunfo: em se entregar, em dar a vida. Assim, conquistou uma descendência. 

A dor como meio de cura e transformação

A união no sacrifício de Cristo que vivemos, se unido à Cruz de Jesus, pode se tornar, para nós, motivo de alegria, salvação e libertação dos pecados dos quais somos reféns. O que nos cabe é não desperdiçar nenhum sofrimento. Deus quis que a dor fosse um meio de cura e transformação para nós.

Vejamos o Sermão das Bem-aventuranças: "Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o Reino de Deus! Bem-aventurados vós que agora tendes fome, porque sereis saciados! Bem-aventurados vós que agora chorais, porque havereis de rir! Bem-aventurados sereis quando os homens vos odiarem, vos expulsarem, vos insultarem e amaldiçoarem o vosso nome por causa do Filho do Homem! Alegrai-vos, nesse dia, e exultai, pois será grande a vossa recompensa no céu (Lc 6,20-23). 

Experimente, hoje, entregar seus sofrimentos ao Crucificado!

Notemos que os bem-aventurados são os que passam por sofrimentos. Eles nos forjam a sermos melhores, configurando-nos a Jesus, dando-nos a capacidade de desejar o Céu e de não nos apegarmos a este mundo. Fazem-nos ver que a vida não se encerra aqui e que o sofrimento acontece na vida de todos, sem distinções, a fim de curar nossas almas, tornando-as mais aptas ao Reino.

Em Colossenses, Paulo afirma: "o que falta às tribulações de Cristo, completo na minha carne" (Cl 1,24). Claro que o sacrifício de Jesus é completo. Mas nossas lidas diárias, se colocadas em Deus, serão para nós e para a Igreja a participação no sacrifício do Senhor e, portanto, benefícios. Experimente hoje entregar seus sofrimentos ao Crucificado!

Elane Gomes
Membro Segundo Elo da Comunidade Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/o-amor-revelado-no-madeiro/

12 de setembro de 2025

Por que a esperança não engana?

A esperança é uma virtude teologal fundamental na fé cristã, profundamente enraizada nas Escrituras e na tradição da Igreja. Mas por que dizemos que a esperança não engana? Vamos explorar este tema à luz da fé católica.

1. Fundamento Bíblico

A esperança cristã é firmemente baseada nas promessas de Deus, que são infalíveis. Em Romanos 5,5, São Paulo afirma: "A esperança não engana, porque o amor de Deus foi derramado nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado". Essa passagem assegura-nos que a esperança é sustentada pelo próprio amor de Deus, que é eterno e imutável.

Desarmando o coração, o caminho para a paz e a esperança

Crédito: jacoblund / GettyImages

2. A fidelidade de Deus

Deus é fiel às Suas promessas. Ao longo da história da salvação, vemos inúmeras vezes como Deus cumpre as Suas promessas ao Seu povo. Desde a Aliança com Abraão até a vinda de Jesus Cristo, Deus mostrou-Se sempre fiel. A esperança cristã, portanto, não é uma expectativa vazia, mas uma confiança segura na fidelidade de Deus.

3. A Ressurreição de Cristo

A Ressurreição de Jesus é o maior fundamento da nossa esperança. Como São Paulo escreve aos Coríntios (1Cor 15,17), "Se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé". A vitória de Cristo sobre a morte dá-nos a certeza de que, assim como Ele ressuscitou, também nós ressuscitaremos. Essa esperança na vida eterna é o que nos sustenta nas dificuldades e tribulações da vida.


4. Ação do Espírito Santo

O Espírito Santo é o consolador e o guia que nos fortalece na esperança. Ele nos ajuda a manter os nossos olhos fixos nas promessas de Deus, mesmo quando enfrentamos desafios. A presença do Espírito Santo na nossa vida é um sinal de que Deus está conosco, guiando-nos e sustentando-nos.

5. Testemunho dos santos

Os santos são exemplos vivos de esperança inabalável. Eles enfrentaram perseguições, sofrimentos, doenças e até a morte com uma confiança inabalável nas promessas de Deus. A vida deles são testemunhos poderosos de que a esperança em Deus nunca decepciona.

6. O jubileu da esperança

O Jubileu da Esperança, também conhecido como Ano Santo de 2025, é um período de graça extraordinária promovido pela Igreja Católica. Esse Jubileu foi solenemente inaugurado pelo Papa Francisco em 24 de dezembro de 2024, com a abertura da Porta Santa da Basílica de São Pedro, e termina em 6 de janeiro de 2026, sob o tema "Peregrinos da Esperança".

Este evento simboliza um tempo de renovação espiritual, reconciliação e vivência profunda da Misericórdia Divina. Inspirado no tema "A esperança não confunde" (cf. Rm 5, 5), o Jubileu convida-nos a refletir sobre a essência da esperança cristã: uma confiança inabalável no amor de Deus .1

7. Bula de Proclamação do Ano Jubilar do Papa Francisco sobre a esperança 2

O Papa Francisco enfatizou a importância da esperança em várias das suas catequeses e escritos. Ele descreve a esperança como "a âncora e a vela" que nos guiam para um futuro mais fraterno e harmonioso 3 .  Nas suas catequeses sobre a esperança cristã, o Papa destaca que a esperança não desilude, pois está enraizada no amor de Deus que caminha ao nosso lado 4 . Ele nos encoraja a viver na expectativa da Revelação do Filho de Deus, confiando que, apesar das dificuldades, Deus está sempre conosco.

Conclusão

A esperança não engana porque está enraizada na fidelidade de Deus, na ressurreição de Cristo e na ação do Espírito Santo. É uma virtude que nos sustenta e nos dá força para enfrentar as dificuldades da vida com confiança e alegria: "A esperança cristã não engana nem desilude, porque está fundada na certeza de que nada e ninguém poderá jamais separar-nos do amor divino"5.

Que possamos sempre manter viva essa esperança, certos de que Deus é fiel e cumprirá todas as Suas promessas.

Paula Ferraz
Missionária do 2º elo, Frente de Missão Fátima – Portugal

Referências:
1 https://www.vaticannews.va/pt/papa/news/2024-12/papa-francisco-missa-natal-porta-santa-jubileu-2025.html.
2 Spes non confundit – Bula de proclamação do Jubileu Ordinário do Ano 2025 (9 de maio de 2024
3 https://formacao.cancaonova.com/igreja/jubileu-2025/jubileu-da-esperanca-o-caminho-para-uma-nova-realidade/.
4 https://www.vatican.va/content/francesco/pt/cotidie/2013/documents/papa-francesco_20131031_meditazioni- 23.html.
5 Spes non confundit – Bula de proclamação do Jubileu Ordinário do Ano 2025 (9 de maio de 2024).


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/por-que-esperanca-nao-engana/

10 de setembro de 2025

O suicídio precisa ser visto com atenção

Campanha de prevenção ao suicídio é mais grave do que as pessoas imaginam

O mês de setembro teve início com uma proposta de conscientização trazida por alguns órgãos de promoção da saúde com o tema prevenção do suicídio.

Foto ilustrativa: Panuwat Dangsungnoen by Getty Images

Essa campanha traz o assunto do suicídio para a discussão popular com intuito de prevenir mortes que poderiam ser evitadas. A quantidade de vidas perdidas ultrapassa o número de vítimas da AIDS e de alguns tipos de câncer. Ou seja, tornou-se alvo de preocupação por comprometer tantas pessoas de diversas idades, classes sociais, cores etc. É hoje um assunto de saúde pública.

Dados interessante traz certa perspectiva de sucesso com campanhas, o fato que nove em cada dez casos poderiam ser evitados. De acordo com a Organização Mundial da Saúde. Ou seja, o assunto deve ser amplamente debatido e os preconceitos esclarecidos, para que o maior número de pessoas seja alcançado e indivíduos sejam salvos de um possível suicídio.

Como identificar alguém que tenha ideação suicida? É possível ajudar de algum jeito?

Para iniciar o assunto e já fazer uma boa provocação sobre o tema, vou dizer que qualquer ser humano é passível de pensar sobre a morte e desejá-la em casos específicos da vida. Sim. Eu e você podemos passar por situações fortes na vida ou apresentar alguma disfunção biológica que nos faça, em algum momento, pensar em morrer. Ou simplesmente, podemos achar os dias muito cinzas, perder o encanto pela vida e o sentido no existir.

As dores existenciais, que são aquelas dores na alma, não localizadas por nenhum exame de imagem, podem ser insuportáveis e fazer o indivíduo desejar a morte.

Atentar-se para essas realidades já é um grande passo no combate ao preconceito que existe em relação a doenças como depressão e bipolaridade, por exemplo, e que são estopins para o suicídio.

Os sinais

Existem pessoas que verbalizam suas dores e dão dicas de que pensam no suicídio, dizendo frases como: "preferia estar morta", "não deveria ter nascido", "o mundo seria um lugar melhor sem mim" ou até aquelas frases mais inocentes como "queria sumir" e "desejo dormir e não acordar mais". Esses são alguns sinais de que o indivíduo não está bem e precisa de ajuda.

O mais indicado seria um acompanhamento psicoterapêutico e, se necessário, um psiquiatra, que vai avaliar a necessidade de medicamento. Aos poucos, a população começa a se conscientizar de que os cuidados com a saúde psíquica são tão importantes e necessários quanto os cuidados com a saúde física. Assim, um medicamento para alguns casos pode ser extremamente eficaz no combate às doenças como depressão, que pode levar ao suicídio. Só para aproveitar o assunto, é válido dizer que a informação é o melhor remédio no combate ao preconceito, que ainda persiste quando o assunto é depressão, terapia e medicamentos psiquiátricos.

Voltando a falar sobre como identificar pessoas que tenham ideação suicida, existem também aquelas que não costumam expor o sentimento. Nesses casos, a observação dos comportamentos será mais valiosa que as frases ditas.

Quando alguém apresenta mudanças comportamentais que persistem por muitos dias, o sinal de alerta pode ser acionado, ou seja, se alguém que costuma ser falante, risonho e sociável, passa a ficar mais retraído, isolado e triste, certamente algum tipo de ajuda está precisando.

Setembro Amarelo

Na campanha do Setembro Amarelo, existe uma chamada que diz: "falar é a melhor solução". Então, esteja disposto a dialogar com alguém que parece não enxergar um sentido na vida. O outro apresenta alguma resistência ao diálogo, procure formas de acessar o seu coração. Por mais desafiador que pareça, lembre-se, nessas horas, que nenhum ser humano é inalcançável.

Por algum ou vários motivos, pode acontecer de alguém desenvolver mecanismos de defesa para se proteger de algumas dores, podendo ficar extremamente calado ou agressivo em certos momentos. Se o diálogo parecer impossível num primeiro momento, use a sua criatividade e o seu conhecimento sobre essa pessoa que você ama; inove, surpreenda e descubra diferentes formas de mostrar que você a ama e está ao lado dela nesse momento difícil.


Demonstre afeto

Gestos podem traduzir algumas palavras significativas. Fazer uma comida especial, comprar uma lembrança, escrever bilhetes, ajuda a derreter a geleira que estabeleceu no coração do outro. Ouse. Arrisque-se nas tentativas de alcançar alguém que precisa de ajuda.

É importante também avaliar a profundidade da situação, ou seja, se a pessoa está passando por um sofrimento pontual, alguma tristeza ou frustração, não vá logo achando que ela está pensando em suicídio. As tristezas são tão importantes quanto as alegrias, e podem trazer ensinamentos preciosos, que nem todo sorriso traz.

Então, se são lágrimas que se apresentam nessa hora para o seu amigo, chore junto com ele e, quando possível, ajude-o a enxergar novas perspectivas a partir desse sofrimento. Muitos ignoram ou rejeitam as incríveis possibilidades de crescimento que moram numa dor. Não seja dessas pessoas.

Por fim, é possível encontrar materiais de excelente qualidade que informam sobre o suicídio e algumas formas de prevenção.

Procure ajude

Como cada ser humano é único e cada caso se apresenta de forma muito particular, é importante compreender o que o familiar, o amigo, o parceiro ou até o colega de trabalho está vivenciando nesse momento, como é sua visão de mundo e qual a melhor forma de ajudá-lo. Assim, se encontrar uma oportunidade, pergunte abertamente: o que você gostaria que eu fizesse para ajudá-lo nesse momento?

Lembre-se, antes de qualquer coisa, que você está se propondo a entrar no território precioso e sagrado do outro, portanto, haja com respeito, cautela e evite julgamentos. Muitos podem achar que "dando um chacoalhão", a pessoa irá melhorar. Não é bem assim.

Pensar em tirar a própria vida é algo sério, uma alternativa que muitos escolhem por estarem em desespero. Sem perspectivas de vida, Portanto, recubra-se de amor, compaixão e uma dose extra de compreensão para colocar-se ao lado de alguém que precisa da sua ajuda.

Equipe Formação Canção Nova


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/atualidade/comportamento/o-suicidio-precisa-ser-visto-com-atencao/

9 de setembro de 2025

Santa Teresinha e os tempos da modernidade

A simplicidade que salva

Sem dúvida, Santa Teresinha está entre os santos que mais despertam a devoção na Igreja hoje em dia. Mas os santos não são tanto para serem admirados e vistos como milagreiros; mais que isso, eles foram elevados aos altares para serem imitados.

O sentido da vida segundo Santa Teresinha do Menino Jesus

Créditos: Domínio Público.

Nesse mundo secularizado – onde o sagrado tem pouco valor diante das realidades de uma época marcada pela correria de quem não tem tempo a perder e pela superficialidade do homem tecnológico, um mundo que modela no homem uma personalidade sentimentalista, individualista, hedonista e com tanto outros "ismos" –, Santa Teresinha, de dentro de sua clausura do final do século XIX, tem alguma coisa a nos dizer hoje?

A espiritualidade de Teresinha é um caminho cotidiano de salvação. Ela propõe que todos os gestos, por mais simples que sejam, se forem feitos com amor, têm valor redentor: "Apanhar um alfinete por amor pode converter uma alma. Que grande mistério!". Só Jesus pode dar um valor tão grande às nossas ações.

 Amor no dia a dia

Por isso sua proposta é perfeita para nós hoje: a santidade não se resume a gestos de piedade e longos tempos dedicados ao sagrado, mas pode ser encontrada na correria da vida do mundo. Perfeito! Sim, na correria do dia a dia, se cada coisa for feita com amor, tem valor de eternidade, porque traz a presença de Deus para aquela situação.

Aliás, é um remédio para o mal da pós-modernidade: a depressão, porque, se cada coisa da vida ganha significado pelo amor, nada será mera repetição maçante de atos, mas tudo será sempre novidade, porque o amor traz o brilho do novo para as coisas da vida.


O último lugar que se transforma em vitória

Individualismo, solidão e competitividade são tendências que atraem o homem de hoje. Estamos ligados no mundo, mas sempre isolados numa telinha de celular ou telona de TV. E quando saímos daí, é para competir em lucro, poder, beleza física; enfim, todos querem o sucesso.

Nisso Teresinha era muito diferente de nós, não porque não tinha a telinha ou a telona, e sim porque vivia de amor, e o amor é sempre atual. Amante do último lugar, o único pódio pelo qual competia, e vivendo sob a leveza do escondimento, Teresinha em tudo queria fazer o bem: "Só o amor me atrai".

Nem o sucesso da santidade ela queria: "Não se deve trabalhar para tornar-se santa, mas para dar prazer ao Senhor". Sua meta era realmente partilhar o bem, e por isso surpreendeu até os santos, que querem o céu como seu troféu, ao dizer que queria passar o céu fazendo o bem na terra.

Alegria das irmãs durante os recreios, ela sabia ser agradável, viver em comunidade e partilhar de tal maneira que podemos aplicar a ela a frase do místico alemão Johann Tauler (séc. XIV): "Se eu amar o bem que está no meu próximo, mais do que ele mesmo o ama, esse bem me pertence mais do que a ele".

Mas Teresinha não seria hoje uma mestra somente através de seus bons exemplos. Por meio de sua doutrina da pequena via, ela daria duros remédios a nós, que gostamos de conforto e guloseimas. Ela diz que "um dia sem sofrimento é um dia perdido". Sem dúvida, Santa Teresinha tem muito a nos ensinar no caminho necessário da ascese e penitência.

Valores perenes para tempos voláteis

Ela não nos convida a fazer coisas exorbitantes, tão distantes do nosso padrão de bem-estar, mas coisas simples, como ela mesma fazia: durante as refeições, não se recostar ao encosto confortável da cadeira. Coisas realmente tão simples quanto possíveis.

Mas talvez a lição mais dura que ela tem a nos dar seja sua convicção de que o amor não é sentimento ou emoção, mas decisão da vontade. Verdade difícil num mundo em que os relacionamentos são tão superficiais e a capacidade de se comprometer tão volátil, que casamento se faz por união afetiva e religião se escolhe pela medida de boas sensações e retribuições divinas.

Teresinha é um daqueles santos que ultrapassam o seu tempo, porque sua vida e seus ensinamentos comunicam valores perenes. Especialmente ela, que soube reconhecer os sinais dos tempos e, com consistência e profundidade, tem uma profecia atual, merece realmente o título de "a maior santa dos tempos modernos", como a chamou São Pio X (1835-1914).



André Botelho

André L. Botelho de Andrade é casado e pai de três filhos. Com formação em Teologia e Filosofia Tomista, Andrade é fundador e moderador geral da comunidade católica Pantokrator, à qual se dedica integralmente.
http://www.pantokrator.org.br

Contato: http://facebook.com/andreluisbotelhodeandrade


Fonte: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/santa-teresinha-e-os-tempos-da-modernidade/